Quinta-feira, Abril 18, 2024
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Nuno Batalha em entrevista

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O presidente da Mesa Administrativa da Confraria de Nossa Senhora da Nazaré garante que a instituição vive um clima de estabilidade como não acontecia há décadas. E que a política deixou de estar associada a uma entidade de grande relevância no concelho e no distrito. Ainda assim, assume ter cometido erros neste processo.

 

O presidente da Mesa Administrativa da Confraria de Nossa Senhora da Nazaré garante que a instituição vive um clima de estabilidade como não acontecia há décadas. E que a política deixou de estar associada a uma entidade de grande relevância no concelho e no distrito. Ainda assim, assume ter cometido erros neste processo.

Jogou basquetebol na Biblioteca e gere o escritório de contabilidade da família há várias décadas, mas foi o trabalho que desenvolveu na paróquia da Nazaré que o levou, em 1996, a assumir a liderança da Confraria de Nossa Senhora da Nazaré. Após uma primeira passagem, saiu devido à limitação de mandatos, voltando como assessor da administração de Abílio Santiago. Mais tarde, voltaria a candidatar-se e a derrotar Reinaldo Silva, num processo que levantou muita celeuma, devido a práticas raramente associadas à igreja na realização das eleições. A cumprir uma segunda passagem pela Mesa Administrativa, assume erros no passado, mas diz que foram danos colaterais essenciais para manter viva a instituição e garantir a sua viabilidade.

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REGIÃO DE CISTER (RC) > Está na segunda passagem pela administração da Confraria. Que diferenças existem na gestão da entidade de hoje para quando entrou nesta casa há 22 anos?
NUNO BATALHA (NB) > Há 22 anos era um miúdo. Tinha 29 anos e tinha um sonho, pensando que tinha competências para gerir e gostava de pôr isso em prática. A igreja também me dizia muito. Tinha vontade de provar a mim próprio que tinha uma veia para gestão, não tinha o curso ainda mas havia de ter um dia. Isso juntou-se a um período de crescimento da economia portuguesa. A economia portuguesa crescia, os dinheiros europeus abundavam e isso, obviamente, possibilitou à Confraria passar da realidade de 1996, uma instituição com 70 trabalhadores, com orçamento de 750 mil euros por ano, para uma instituição com 200 trabalhadores e com um orçamento de 4 milhões de euros. Olhando para trás, não foi difícil crescer, foi aproveitar o momento das “vacas gordas” e a Confraria fê-lo bem. Esta foi a imagem da primeira passagem, a meninice, a juventude. Hoje, tenho 51 anos e encontrei a Confraria num desastre. O desafio era saber se havia capacidade de a gerir e se era possível devolver à Confraria a estabilidade que ela necessitava. Digamos que nos deixámos do tempo dos grandes projetos e das grandes aventuras, para ir para o tempo, que é muito mais rico e profundo, dos detalhes na gestão. Na primeira fase construiu-se muita coisa, mas olhou-se pouco para as pessoas. Agora há um maior foco nas pessoas, não estamos em tempo de grandes obras, até porque não há muito mais para onde crescer. 

RC > E em termos económicos?
NB > Ao contrário do que sucedeu na primeira passagem, na segunda vez estávamos no centro do olho do furacão da crise. Recordo-me que o resultado deixado pela administração anterior no exercício de 2010 foram 520 mil euros negativos… Em 11 meses de trabalho conseguimos baixar esse valor para 49 mil euros negativos e no segundo ano, ainda com um valor baixo, mas passámos do vermelho para o verde e a partir daí foi sempre manter performances económicas boas. Esta recuperação foi muito importante, nomeadamente para a banca. Chegámos a ter em 2011, nos primeiros meses desta administração, as contas congeladas. Nós já tínhamos as pernas cortadas, e a banca estava a dar a machadada final. Também percebo que todos os parceiros viviam os mesmos tempos que nós, uma crise enorme, mas aí senti mesmo que fomos ajudados por Deus a sair daquele buraco. Pode parecer ridículo, mas era impossível sair em contraciclo de uma situação tão agonizante. Não esquecendo que no universo de 200 e tal pessoas, mandámos quase 90 embora. É uma fatura social enormíssima, são 90 famílias a multiplicar por quatro e vê-se as pessoas que foram atingidas…

RC > Foi o momento mais difícil?
NB > Foi o momento mais difícil. Houve momentos em que chorei, saía da sala de reuniões a chorar. Primeiro porque sabia que as medidas que tinham de ser tomadas eram as que socialmente acabavam por me deixar apenas com a cabeça fora de água a respirar por uma palhinha. Ainda que isso me traga uma angústia pessoal, quando se tem que estar à frente destas coisas temos de assumir o risco. Sair de uma situação dessas e passados alguns anos ser reconhecido pelo IAPMEI como PME Líder 2016, 2017, obviamente que nos deixa realizados. Sendo certo que isto só faz sentido, como disse, pondo o foco nas pessoas. Foram tempos e experiências completamente distintas, sem dúvida gostei muito mais da segunda passagem do que da primeira. A segunda é a que acaba por ser mais importante na vida da Confraria dos últimos anos. 

“Na primeira [passagem pela Confraria] construiu-se muita coisa, mas olhou-se pouco para as pessoas. Agora há um maior foco nas pessoas, não estamos em tempo de grandes obras, até porque não há muito mais para onde crescer”

 

RC > Foi um período conturbado…
NB > Em 2010, a Confraria atingiu o máximo da sua exposição da vida política e à utilização política. E participei nisso… Não fui inocente. Tendo em consideração a quantidade de irmãos que a minha candidatura fez para podermos derrotar os adversários até fomos os maiores responsáveis. Mas também sabia que essa era a única forma que tinha de cá chegar. Não valia a pena estarmos armados, passe a expressão, em “figuras angélicas” à espera de um milagre. Também nos cabe ter uma determinada astúcia, não no sentido pejorativo, para perceber que, por vezes, as coisas têm de ser feitas contra a nossa forma de estar e pensar para conseguirmos os resultados finais sejam bons. Não estou arrependido do que fiz, sabia que era a única forma que podíamos retirar a administração que cá estava, porque a instituição tinha os dias contados. Foi a pensar no bem da instituição que o fizemos. Obviamente que esse processo teve outra fatura: se contribuímos para a politização da Confraria, havia o segundo trabalho em tentar limpar a porcaria que foi feita. Servimo-nos das pessoas, as pessoas serviram-se de nós… esse peso também foi uma página negra. Tentou-se corrigir com o processo dos 2.100 confrades, que gerou muita celeuma e que percebo perfeitamente.  Avaliámos todos os prós e os contras, sabíamos que a fatura a pagar erra essa. Também sabíamos que para devolver a tranquilidade e a normalidade à Confraria teríamos de passar por esse processo. A fatura ainda não esta paga, há muita gente chateada com o assunto e percebo porquê. Não gostei do que fiz da primeira vez, muito menos da segunda. Foi a última convulsão e já se passaram dois ou três anos, agora vive-se um período de muito maior estabilidade.

RC > Falando de política e não de “politique”. Como estão as relações com a Câmara?
NB > Estão bem, estão ótimas. Houve também um caminho a percorrer, até porque havia uma certa desconfiança que isto pudesse não correr muito bem. Temos feito um esforço enorme para criar aproximação e para que as coisas correrem bem entre as entidades. Na primeira passagem a atitude não foi bem essa, até porque chegámos a dar uns… pontapés nas pedras com Jorge Barroso, com quem tinha uma grande aproximação. Ainda assim fizemos obras sem licença, embargámos outras à Câmara… Hoje, com um processo de maturação completamente diferente, sabemos que as coisas não podem ser assim. Tambem senti que a aproximação foi recíproca e fizemo-lo sentindo que da parte deste executivo municipal, que na altura também estava a chegar e a aprender, também se fez um caminho em relação à instituição, de reconhecimento e de aproximação. Hoje o que existe é um clima de parceria, de confiança e de respeito.

RC > A aposta da Confraria no 1.º ciclo apanhou a comunidade da Nazaré de surpresa. Como surgiu o projeto?
NB > Há dois grandes motivos que estão na base desta ideia. Um deles tem a ver com a dificuldade que sentimos em manter as nossas crianças no pré-escolar, pois aqui têm de pagar uma mensalidade e no público aparentemente o serviço é gratuito. Todavia, feitas bem as contas as mensalidades que pagam aqui não são muito superiores ao que acabam por ser os custos no público. Nesse sentido, pensámos em construir uma estratégia de ensino mais atrativa, de forma a fidelizar também as famílias. Do berço aos 2 anos não temos concorrência no mercado local, perdemos é na pré. Pensámos que se conseguíssemos abrir o 1.º ciclo, com um modelo atrativo em termos de qualidade/preço, conseguíamos garantir que essa saída era menor, ou pelo menos, manteríamos uma turma da pré. O outro motivo tem a ver com algum descontentamento na forma como está massificado o 1.º ciclo no concelho, que apesar de ter ótimas instalações concentra muitos alunos, levando a preocupações subjacentes dos pais. Temos consciência do risco que estamos a correr. É um processo que também rompe mentalidades, mas volto a dizer: tendo em conta o que está incluído [alimentação, transporte, AECs e ATL] na mensalidade de 150 euros, metade do que se pratica no mercado privado, é um valor que não onera o orçamento familiar.

“Em 2010, a Confraria atingiu o máximo da sua exposição da vida política e à utilização política. 
E participei nisso… Não fui inocente”

RC > Qual tem sido a recetividade dos pais?
NB > Estamos num processo de abordagem, estamos a passar à formalização daqueles que manifestaram interesse. O objetivo é formar turmas de 15 a 20 alunos, não mais que isso. Acreditamos que pelo menos aos 15 alunos vamos chegar e arrancaremos com o projeto. Há outro aspeto importante: temos a consciência que vamos aprender, não temos know how nenhum nisto e, por isso, também é bom ir devagar. Em alguns casos, os pais podem ter vontade, mas não terão a coragem para dar o passo enquanto não virem como é que as coisas funcionam. É um processo difícil, há uma atitude cada vez mais exigente e também mais desconfiança por parte dos pais e percebemos perfeitamente que primeiro temos de mostrar o que valemos para depois gerar um clima de confiança, porque penso que o preço nunca será um fator de afastamento.

RC > A Confraria tem sentido muita concorrência no pré-escolar…
NB > É verdade que sentimos concorrência das freguesias limítrofes. Aquando da minha primeira passagem pela Confraria abrimos o Infantário e admito que as coisas foram mal conduzidas. Abrimos um “barco” novo, mas demos um rombo no casco enormíssimo. Qual foi a estratégia formidável que deu cabo disto tudo? De um ano para o outro com alguma insensibilidade os preços dispararam. É engraçado porque, volvidos 15 anos, temos exatamente as mesmas mensalidades que foram fixadas à data… Apresentámos um equipamento novo, mas não tivemos a sensibilidade para manter cá os utentes. Muitos pais acabaram por procurar um serviço fora da Nazaré e depois é como tudo: quando se prova um prato novo e se gosta, já não queremos o outro. Quando regressei à Confraria, percebemos que o melhor seria inverter a estratégia. Durante este período, tentámos melhorar a performance interna, tentámos que os docentes e não docentes tivessem uma atitude diferente no sentido de melhorar a qualidade do serviço e que isso nunca fosse obstáculo para os pais optarem por outras realidades, e ao mesmo tempo ajustar o serviço a um preço que fosse mais conducente com a concorrência.

RC > É curioso que a Câmara e a Confraria estiveram num plano inclinado durante uma década e agora vivam ambas algum fulgor…
NB > Esse clima também é gerado pelo que disse anteriormente. Para o executivo municipal agora é mais fácil compreender que a Confraria não vive nem se coloca na sociedade nazarena como uma ferramenta política, nem como uma ameaça porque muitas vezes foi utilizada como trampolim. Há um clima que ajudou imenso, esse é o papel da Confraria. Obviamente que não pode ser um dado adquirido, nem tem de ser, que cada pessoa que passe à frente da Confraria não possa posteriormente seguir o seu caminho, nomeadamente na política. Mas não é o meu objetivo, ao contrário do que muita gente possa pensar, nem nunca foi. Desde 1996 é raro o ano em que há eleições autárquicas em que não sou convidado e nunca aceitei. Podia escrever um livro sobre isso… Se me perguntarem se nunca senti esse desejo, no meu percurso gostaria de ter feito alguma coisa pela Nazaré fora da Confraria. Mas este é o meu papel, mas a minha missão na paróquia não é compaginável com uma missão política. Fui pondo as coisas no seu lugar, embora muitas vezes houvesse a tentação.

 

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