A história de vida do pequeno José Maria poderia ser uma verdadeira sinfonia, tal a amplitude dos sons que já tocaram em extremos opostos por várias ocasiões e que são replicados nos episódios que já viveu com apenas 10 anos. Ora mais efusivos, alegres e contagiantes – como quando toca piano, brinca com o irmão ou está em família –, ora mais contidos, receosos e intimidantes – quando passa horas em consultas, em esperas intermináveis de hospitais ou nalguma das oito vezes que já entrou num bloco operatório. Mas, vamos por partes.
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O alcobacense José Maria nasceu a 18 de agosto de 2014, já com o diagnóstico de que padecia de agenesia renal (apenas um rim). Pouco depois do nascimento viria a ser-lhe diagnosticada sindactilia cutânea nos dedos das mãos e pés (uma deformação nos dedos das mãos e dos pés, que estão unidos), cenário agravado com uma surdez de transmissão, confirmada dois anos depois.
O diagnóstico não era animador, mas a família decidiu abraçar os desafios com um sorriso na voz: “Não nos lamentamos, nem fazemos da nossa história um drama. Tentamos, sim, focar-nos na resolução. Temos um desafio, então vamos resolvê-lo”, atirou, de imediato, o pai, Jorge Humberto. A conversa com o REGIÃO DE CISTER juntou toda a família: José Maria, o pai, a mãe (Aline Duarte), e também o irmão João, dois anos mais novo, que escutou com máxima atenção toda a história do irmão, que acabaria por sofrer um revés anos mais tarde, quando após uma cirurgia o pequeno “Zézinho”, como é carinhosamente tratado pelos familiares, conseguiu mexer pela primeira vez os dedos de forma separada.
Foi aí que os pais, incentivados pela paixão que o menino já ia evidenciando pelo piano, o decidiram inscrever na Academia de Música de Alcobaça. “Foi um estímulo para exercitar os dedos após a cirurgia, mas também acabou por revelar-se muito positivo no desempenho escolar dele”, explicou a mãe, com um brilho nos olhos ao relatar o orgulho que nutre pelos filhos.
O talento estava lá: José Maria já foi o 2.º classificado num concurso dinamizado pela Academia de Música, mas para o pequeno pianista essas “coisas não interessam”. “Quero é ser feliz e a música faz-me feliz”, retorquia, desarmando qualquer guião de entrevista previamente preparado e levando a conversa para “terrenos” onde o pequeno José Maria a queria manter. Afinal, a história é dele e ele quer mesmo escrevê-la à sua maneira. “O que se passou não interessa, vamos é falar de música”, exultou.
Assim foi. Já depois de explicar que não tem referências específicas na música, e que é admirador de um pouco de todos os estilos musicais, acrescentou que gosta de aprender a tocar algumas músicas de filmes de animação infantis. Não sabe se quer ser músico profissional – “implicaria tocar para muita gente e isso deixa-me envergonhado”, justificou –, mas sabe que quando se senta em frente ao piano – “pelo menos 30 minutos todos os dias” – se sente em “casa”. “Bem, talvez um bocadinho mais. Aí uns 45 minutos”, acrescentou, sorridente, já depois de esconder a timidez com que recebeu o REGIÃO DE CISTER em casa. A receção acabou por ser acalorada com a apresentação de um tema que o próprio está a compor e a que deu o nome “O que é o amor?”.
Não existe, porventura, uma definição exata do que é o amor, mas na composição musical que tem sido a vida de José Maria, poderemos testemunhar que é um verdadeiro hino (d)à alegria e (d)à superação. No fundo, como se o amor fosse somente uma canção feliz.