Alexandre Delgado e Rui Morais, diretores artístico e executivo do Cistermúsica, respetivamente, fazem o balanço da edição de 2016 do festival e apontam estratégias e metas para o próximo ano.
Alexandre Delgado e Rui Morais, diretores artístico e executivo do Cistermúsica, respetivamente, fazem o balanço da edição de 2016 do festival e apontam estratégias e metas para o próximo ano.
REGIÃO DE CISTER (RC) > Que balanço fazem da maior edição de sempre do Cistermúsica?
Alexandre Delgado (AD) > Quero destacar alguns aspetos que correram melhor, como foi o caso de um dos primeiros concertos. O espetáculo de Ludovice Ensemble foi muito emocionante, o agrupamento trouxe a Alcobaça música do Henry Purcell, que compôs para Catarina de Bragança. Trata-se de um dos maiores génios da música e são um grupo fantástico com obras internacionais de superior qualidade. O concerto decorreu uma semana depois do Brexit… mostrando o espírito europeu no seu melhor.
Rui morais (RM) > Destaco a realização de muitos concertos descentralizados, que é um dos nossos objetivos, quer dentro do concelho, quer fora. É muito gratificante ver que em muitas das freguesias em que temos vindo a apostar nos últimos anos, independentemente do programa ou do agrupamento, há sempre concertos esgotados. E isto é muito bom porque muitas destas freguesias não tinham tradição em assistir a concertos de música erudita. Na verdade, podemos dizer que os concertos do Cistermúsica já se tornaram uma rotina, no bom sentido. O festival atingiu uma grande dimensão, tanto que os 36 espetáculos da programação não se realizaram só no concelho, como também já um pouco por todo o País. É uma logística brutal, mas é muito gratificante ver que o nosso trabalho faz sentido e que as pessoas estão a aderir ao Cistermúsica.
RC > O festival tem vindo constantemente a crescer ao longo das últimas edições. Esta é uma lógica para manter?
RM > Em Alcobaça não há muito mais margem para crescer, porque temos anualmente 15 ou 16 espetáculos. Onde podemos crescer é na descentralização: temos uma lógica que é contracorrente com aquilo que se passa em Portugal. Programamos em rede para criar sinergias e consideramos que faz todo o sentido aproveitar a vinda de alguns artistas internacionais de renome. Ao invés de tocarem apenas uma vez no Cistermúsica ou noutro festival qualquer, podem fazer vários concertos. Programamos esses agrupamentos em rede, fazendo com que mais populações possam assistir a grandes concertos desses grupos. Foi uma pena, por exemplo, não conseguirmos que o Henschell Quartet atuasse no norte ou no sul do País, pois teríamos prestado um serviço público a essas populações e também teria sido possível baixar os custos individualmente.
RC > O que se pode melhorar num festival que já vai com 24 edições?
AD > O que temos de fazer é trabalhar a comunicação nos media e comunicar de forma mais “agressiva” para tentar chegar, sobretudo, às televisões. Esse é o nosso défice. Já estamos muito nas redes sociais e isso é muito bom. Na imprensa, bem ou mal, vamos estando, não só na imprensa regional mas também os meios de comunicação nacionais vão dando atenção ao Cistermúsica. Mas de facto, hoje em dia tudo passa pela televisão, mesmo na era da internet.
RM > É sempre possível fazer melhor. Este ano há que reconhecer que a comunicação surgiu muito em cima do festival, mesmo face a anos anteriores, e isso prendeu-se com alguns ajustes que tivemos de fazer de última hora na programação alheios à direção artística, o que fez com que os materiais de divulgação já saíssem muito em cima do arranque.
RC > No próximo ano assinala-se a 25.ª edição do festival. O que se pode esperar para assinalar esta verdadeira “efeméride”?
AD > Um dos aspetos em que estamos a apostar é em reviver alguns dos grandes momentos do festival mas de uma forma nova e diferente. Um dos pontos altos do festival é a interpretação das “Variedades de Proteu”, em 2005. No próximo ano vamos “pegar” noutra grande ópera de António Teixeira e de António José da Silva, essa parelha genial, que fez óperas de marionetas. Felizmente temos uma grande companhia de marionetas sediada em Alcobaça, a S.A. Marionetas, e estamos a pensar em apostar num grande espetáculo com as Guerras de Alecrim e Manjerona, um dos grandes clássicos máximos do teatro e da ópera nacionais.
RM > A ideia para assinalar os 25 anos é manter um nível artístico altíssimo, como temos tido. Voltar a escolher muito bem os vários agrupamentos, como temos sabido fazer e a sorte de o conseguir. Por outro lado, queremos apostar em agrupamentos que vêm pela primeira vez a Portugal e que acabam por suplantar as expectativas. Muitos são os casos ao longo dos anos em que o Cistermúsica “descobre” agrupamentos que vieram pela primeira vez ao País no âmbito do nosso festival, e depois se tornaram rotina na programação da Fundação Calouste Gulbenkian ou do Centro Cultural de Belém, por exemplo, como foi o caso do Gould Piano Trio.
RC > Os outros festivais de música erudita estão atentos ao Cistermúsica?
RM > Sim, cada vez mais. Hoje o Cistermúsica é reconhecidamente um dos melhores festivais de música do País…
AD > Com um aspeto que o diferencia desde sempre: dar atenção ao património musical português. E nisso foi até influenciador para outros festivais. Hoje em dia programam-se muitos mais agrupamentos nacionais e o Cistermúsica contribuiu para isso. Todos os grupos especializados que fazem pesquisa e fazem estreias modernas sabem que quando querem apresentar os trabalhos, a primeira porta a vir bater é o Cistermúsica porque sabem que é um festival que dá atenção a isso.