Terça-feira, Março 19, 2024
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“No futuro teremos menos jornais regionais, mas serão jornais mais fortes”

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O Secretário de Estado Adjunto do ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional considera, em entrevista dada por escrito ao REGIÃO DE CISTER, que os jornais regionais continuarão a ter leitores fiéis ao papel, mas que a evolução tecnológica impõe uma mudança para o digital num futuro próximo. E explica os novos incentivos ao setor.

O Secretário de Estado Adjunto do ministro Adjunto e do Desenvolvimento Regional considera, em entrevista dada por escrito ao REGIÃO DE CISTER, que os jornais regionais continuarão a ter leitores fiéis ao papel, mas que a evolução tecnológica impõe uma mudança para o digital num futuro próximo. E explica os novos incentivos ao setor.

REGIÃO DE CISTER (RC) > O novo regime de incentivos do Estado à comunicação social prevê o estabelecimento de parcerias entre os órgãos de comunicação social, nomeadamente a nível regional. Esse é o caminho para valorizar o setor?
pedro lomba (PL) > Não há um único caminho para valorizar o setor. Esta dimensão das parcerias é apenas um dos caminhos que consideramos mais apropriados. Nós não forçamos ninguém a cooperar; não impomos parcerias aos órgãos. Mas, considerando o escassíssimo número de parcerias estratégicas que existem na imprensa portuguesa, sobretudo a nível local, parece-nos muito importante que os órgãos de comunicação social local e regional possam ser incentivados a procurar parceiros entre os órgãos nacionais e, novidade relevante, entre os órgãos  de comunicação social de língua portuguesa no estrangeiro, de maneira a valorizar uma lógica de reforço da informação, da opinião pública regional, da ligação entre pessoas em território nacional e no estrangeiro e do próprio desenvolvimento regional. Acreditamos que a partilha de recursos, a cobertura de eventos, a exploração de vias de monetização e obtenção de receitas comuns, são condições indispensáveis para o futuro da imprensa regional.

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RC > Portugal tem perdido muitos títulos a nível local nos últimos anos, mas ainda assim continuamos com uma média de títulos superior à média europeia. Como se explica este fenómeno?
PL >
Os registos de que dispomos apontam para a existência de perto de 800 títulos, mas serão muito menos os jornais realmente activos. Não confirmo essa premissa de continuamos ou não com uma média de títulos superior à média europeia, embora os números sejam de facto elevados. A “tradição” portuguesa é a de imprensa local ou regional nascer ligada ou às dioceses, ou a concelhos, municípios e comunidades locais muito fortes. Portugal é um país pequeno, mas extraordinariamente diverso e localista na sua vivência, o que explica a grande diversidade de títulos que encontramos. Se olharmos para o passado em que ultrapassámos os 1.000 títulos, havia algo de perverso no sistema de incentivos. Hoje, os requisitos de profissionalização e a maior exigência para a candidatura ao sistema de incentivos não facilitam a proliferação de jornais. Os incentivos devem promover a qualidade e a sustentabilidade e há hoje jornais locais ou regionais que sabem que só através da qualidade e duma oferta local distinta podem captar leitores e subsistir. Prevejo por isso que, no futuro, e fruto da adaptação às adversidades económicas e do movimento imparável da Internet, teremos menos jornais regionais mas também teremos jornais regionais mais fortes.

RC > Os apoios do Estado, como o antigo porte pago, não estarão a criar condições para que muitas publicações se mantenham artificialmente? Esse não é um problema para os jornais mais profissionais?
PL >
Os subsídios postais têm perdido a sua relevância no mundo da imprensa. E Portugal não é excepção. Mas outros países com os mesmos valores democráticos de Portugal continuam a usar este tipo de incentivos no apoio aos jornais locais e regionais. Sem isso, o pluralismo de informação, opiniões, de debate público no espaço local e regional ficaria severamente prejudicado.  O público da imprensa local e regional, por tradição e hábitos culturais, está ainda apegado ao papel. A aquisição de hábitos digitais, também por dificuldades de literacia, avança mais lentamente do que nos meios urbanos. A transição para o digital precisa de ser feita e é um dos eixos das nossas opções, mas deve ser feita no tempo e com o ritmo de evolução e adaptação da imprensa local e regional. É isto que achamos que deve ser feito. Na revis ão do regime de incentivos, nós decidimos portanto que os apoios do Estado tem ser orientados para a obtenção de resultados, devem estar associados a um retorno. Promover um maior desenvolvimento digital, maiores  condições de sustentabilidade, maior qualificação dos jornalistas, maior literacia, maior penetração em territórios economicamente vulneráveis ou deprimidos. E devem ser tendencialmente temporários: o novo incentivo ao desenvolvimento digital será por um período de dois anos. Recusamos qualquer manutenção artificial da imprensa, que seria contraproducente para todos. Não queremos ninguém “sentado” em cima dos incentivos. Os incentivos são para quem acredita realmente que pode fazer a diferença no jornalismo profissional e na imprensa de proximidade.

RC > O Estado deveria criar mecanismos de incentivo de jornais e revistas nas escolas, por forma a aumentar os índices de leitura junto dos mais jovens?
PL >
Nós criámos um incentivo à criação de programas de apoio à literacia e educação para a leitura nas escolas. A contrapartida desse programa passará por incentivarmos a distribuição de jornais locais e regionais nas escolas, que poderão ser usados no âmbito daqueles programas. A imprensa local pode ser um meio particularmente eficaz para que os mais jovens ganhem hábitos de leitura de jornais.

RC > O jornalismo regional tem muitas especificidades, mas tem sido quase ignorado pelas universidades. Entende que a academia deveria fazer um esforço no sentido de fomentar o ensino do jornalismo de proximidade?
PL >
O reforço da presença do jornalismo de proximidade nas matérias ensinadas nas universidades é também muito importante. O programa que referi há pouco também se aplica aos estabelecimentos de ensino superior, o que significa que está criado um incentivo para que possa aumentar o ensino e o estudo da imprensa de proximidade.

RC > Como se pode financiar a atividade jornalística num futuro próximo, dado que as receitas publicitárias têm vindo a decrescer em todos os meios, bem como as circulações? 
PL > Nós não temos respostas seguras e cabais para esse problema. Os jornais estão todos a experimentar modelos, a testar alternativas, a procurar ambientar-se a um meio bastante mais hostil. Aquilo que sabemos é que o jornalismo não irá acabar, nem pode acabar. As pessoas querem saber o que acontece no país e na sua rua, precisam de ver esse filme de realidade que é todo o bom jornalismo. Claro que o dilema é se continuam interessados para pagar esse jornalismo. É, de facto, o problema. Existem felizmente sinais de que se mantém essa disposição, vejam-se os resultados obtidos pelo novo jornal online do antigo director do El Mundo, Pedro Ramirez, que obteve verbas elevadíssimas em crowdfunding. Precisamos de criatividade e inovação para encontrar formas de financiamento do jornalismo profissional que não dependam apenas das receitas tradicionais. E precisamos que comunicação social e empresas tecnológicas da internet colaborem mais entre si para monetizar o jornalismo digital. O futuro passa por aí e há muito a fazer.

RC > Como é que perspetiva que seja um jornal no futuro? O papel vai manter-se ou será substituído, em definitivo, pelo digital?
PL >
Penso que o papel se irá manter, para públicos especiais, para circunstâncias especiais, e decerto mais na imprensa local do que na nacional. Mas a transição para o digital é inevitável. E deve ser uma transição assistida por uma boa estratégia política. Quando pensamos que os nossos regimes legais de imprensa não contemplam sequer uma definição de órgãos de comunicação social digitais, temos aí uma parte dos problemas. É preciso agir. 

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