Medo. Foi esse o sentimento que se apoderou de Clara Duarte, 41 anos, quando, ainda no início do mês de março, chegaram os primeiros relatos do novo coronavírus. A responsável da equipa dos frescos do Intermarché de Alcobaça sentiu receio pela família.
Medo. Foi esse o sentimento que se apoderou de Clara Duarte, 41 anos, quando, ainda no início do mês de março, chegaram os primeiros relatos do novo coronavírus. A responsável da equipa dos frescos do Intermarché de Alcobaça sentiu receio pela família.
O trabalho, com o inevitável e constante contacto com o público, levou-a a pensar o pior no momento de voltar a reunir-se com a família: os dois filhos, de 9 e 13 anos, e o marido, asmático, hipertenso e com uma malformação cardíaca. “Ao início foi complicado”, confessa Clara, que trabalha há 20 anos naquela superfície comercial.
Não beijava nem abraçava os filhos. “Dizia para não se chegarem perto de mim. Custou-me e sei que eles sentiam falta de carinho”, recorda hoje, quando já ultrapassou o medo inicial muito por culpa das medidas de prevenção que cumpre religiosamente. “Sei que, apesar de tudo, eles aceitaram bem, já vinham preparados com a informação que receberam na escola”, conta a responsável pelas encomendas de setores com os laticínios ou a peixaria.
Atualmente, e apesar de os receios se manterem, sente-se mais confiante, pelo “calo” que foi ganhando ao longo dos turnos, mas sobretudo graças às medidas de proteção que o Intermarché adotou desde cedo: viseiras, álcool gel em vários locais do supermercado, luvas para trocar sempre que necessário e a possibilidade de lavar as mãos com muita frequência. “O patrão criou logo um grupo no Whatsapp com vídeos a explicar todos os procedimentos de desinfeção, como colocar e remover as máscaras e todos os cuidados a ter”, conta a funcionária do Intermarché.
Desde o primeiro dia em que a pandemia se tornou real no País, quando a entidade patronal reuniu os trabalhadores e explicou os procedimentos, “antes de ser declarado o estado de emergência”, Clara Duarte adotou cuidados especiais. Além da higienização frequente das mãos, a chegada a casa passou a ter contornos de ritual. Tem a “sorte” de viver numa vivenda com garagem e é nessa divisão que deixa o calçado que usou na rua. Segue-se a remoção da roupa, que põe a lavar à parte do vestuário da restante família – “as fardas são sempre lavadas a 90 graus” -, e a higiene pessoal, que começa sempre por esfregar muito bem as mãos, punhos e rosto.
Para trás ficou o período de má memória do primeiro estado de emergência, quando os clientes mostraram relutância em aceitar as medidas de distanciamento. “Sentia-me muito ansiosa porque muitas pessoas levavam a mal quando nos afastávamos se elas se aproximassem e falassem normalmente, como se nada fosse”, recorda. Hoje, tem a noção de que os clientes “aceitam e compreendem muito melhor” o problema que é de todos. Na batalha diária que é ir trabalhar para assegurar bens à comunidade, Clara Duarte nota maiores preocupações por parte das pessoas, que vê de máscara “na sua maioria”, e que respeitam as indicações do supermercado.
Hoje, apesar de ter ultrapassado o pânico inicial da pandemia da Covid-19, o medo do inimigo invisível mantém-se. “Tenho sobretudo receio que aconteça entre os meus”, confidencia, enquanto mantém o desejo de que “isto tudo passe rápido”. Clara Duarte acredita que “se todos cumprirem as medidas de contenção à risca”, as probabilidades de propagação do novo Coronavírus diminuem consideravelmente. Uma luta desigual, é certo, “mas que no fim poderá significar que deixemos de ligar ao que é supérfluo e passemos a dar valor ao que é realmente importante”.