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Memórias da Feira de São Bernardo: o que foi e o que é

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Perdem-se no tempo as origens da Feira de São Bernardo, que desde a Idade Média se realiza anualmente em Alcobaça, no mês de agosto. Bernardo de Claraval, uma das figuras mais ilustres da história do concelho e o impulsionador da Ordem de Cister, é o protagonista da feira secular, que muito mudou ao longo dos anos. Todavia, o certame continua a ser ponto de encontro de conterrâneos e emigrantes, pois agosto em Alcobaça é sinónimo de música, frango assado, farturas e voltinha no carrocel.

Perdem-se no tempo as origens da Feira de São Bernardo, que desde a Idade Média se realiza anualmente em Alcobaça, no mês de agosto. Bernardo de Claraval, uma das figuras mais ilustres da história do concelho e o impulsionador da Ordem de Cister, é o protagonista da feira secular, que muito mudou ao longo dos anos. Todavia, o certame continua a ser ponto de encontro de conterrâneos e emigrantes, pois agosto em Alcobaça é sinónimo de música, frango assado, farturas e voltinha no carrocel.

A feira é hoje um acontecimento cultural cuja envolvência dos alcobacenses é extraordinária, ainda que, ao longo dos anos as características tenham sofrido profundas alterações. Os escassos relatos históricos identificados descrevem o certame secular como um “pequeno encontro” de lavradores e artesãos que levavam para Alcobaça mercadorias com o intuito de troca, vendas ou oferendas ao monge da Ordem de Cister. 

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No início do século XIX, a feira, constituída por mercados de gado, fruta, hortaliças e peixe, “apinhava de gente” no Rossio. No romance “A Praga”, Virgínia de Castro e Almeida descrevia uma Feira de São Bernardo bem diferente da atual. “A feira estava boa no dizer dos entendidos. As barracas de lona pejavam o largo de lado a lado com correntezas, fazendas, ourivesaria, quinquilharia, saltimancos, barracas manhosas de jogos. E o povo circulava, vagaroso, pasmado entre as cores e os reflexos dos estendais, estonteado e encatado com a música estridente dos realejos e dos sólidos desafianados”, descreve a alcobacense. A autora recorda ainda a presença dos “homens de Minde” e das “mulheres da serra”, que amontavam mantas listradas e tecidos, os “barros da região” e as “loiças de Alcobaça”. 

 Em 1892, o jornal “Semana Alcobacense” relata que a edição da feira tinha, à semelhança dos últimos anos, trazido pouca gente à então vila de Alcobaça. “Uma desanimação, só os ourives e os chapeleiros fizeram transações”, lê-se no editoral. 

Anos mais tarde, em 1935, a feira mudou de localização para a Quinta da Gafa, terreno adquirido pela Câmara para ali instalar os Paços do Concelho. As feiras animais foram suspensas devido a epidemias e o comércio de retalho começou a ser o principal chamariz do certame. Três anos depois, os relatos revelam que a feira tinha ganho um novo “fôlego” com um programa cultural bastante preenchido onde se destacavam atuações das Bandas da Vestiaria e de Alcobaça e o “jazz de Pataias”. Nessa mesma edição, o espetáculo de “luzes no céu” (fogo de artifício) reuniu centenas de pessoas no então denominado Parque Municipal General Carmona, atual Praça 25 de Abril.

A popularidade da feira espalhou-se entre os comerciantes e em 1946 a crescente afluência de negócios levou a que fosse imposta a necessidade de marcar lugares com antecedência, algo pouco comum para a época.

Anos mais tarde, a Feira de São Bernardo chegou a estar instalada na Cova da Onça, que era considerada pela organização “um local inegavelmente aprazível” para a realização do certame. Em 1970, o evento pretendia ser uma festa de união entre as terras do distrito de Leiria, promovendo o convívio entre “gentes de fora e os alcobacenses”. Assim, contava com um “Dia do Valado”, no qual era destacada a etnografia e gastronomia da freguesia, havendo também destaque para os “cidadãos da serra”, que traziam as suas “mantas e vestes de qualidade” para comercializar. 

A Feira de São Bernardo de 1971 foi planificada ao nível das suas instalações pelo escultor alcobacense José Aurélio. O investigador Luís Peres Pereira recorda que, à entrada, a expressão Feira São Bernardo apresentava-se como um “grupo escultórico de grande impacto e modernidade”. “Lado a lado, a indústria e a lavoura, com uma fundamental preocupação estética. A sua organização começara em Setembro do ano anterior”, conta o alcobacense. A edição do certame, que teve a duração de dez dias, ficou marcada pela presença de Maria de Lurdes Resende e pelo Festival de Chita.

Depois de uma fase próspera, o evento voltou a ser descrito pela imprensa apenas como uma “pequena manifestação recreativa”. Segundo a edição de 23 de agosto de 1990 do jornal “Correio da Manhã”, era urgente “animação para devolver vida a uma festa apagada”. Perante um cenário tão pouco animador, o então presidente de Câmara de Alcobaça, Miguel Guerra, decidiu mudar o conceito do evento e lançar uma exposição comercial e industrial. O objetivo era dar a conhecer à população local as capacidades económicas do concelho, bem como de localidades vizinhas. À data, o chefe do executivo municipal congratulou-se pela “aposta ganha” porque “se mais espaço houvesse nos pavilhões, mais comerciantes queriam marcar presença”. 

Foi também na edição de 1990 que a Feira de São Bernardo recebeu o primeiro grande artista António Santos, o homem estátua dos Pisões com recorde mundial de imobilismo. Uma performance peculiar, que se revelou um verdadeiro sucesso.

Nos anos seguintes, a organização tentou inovar e procurar surpreender os visitantes. Algumas das atividades ficaram na memória, como é o caso da Aldeia de São Bernardo, uma recriação de uma aldeia tradicional, e a realização de um jogo de horseball, que é como quem diz, futebol a cavalo.
Depois da realização da feira na zona do mercado semanal, junto às margens do rio, durante vários anos, a zona de comércio deslocou-se para as imediações do MercoAlcobaça, havendo uma segmentação entre comércio local (que passou a concentrar-se no interior do recinto MercoAlcobaça) e o comércio não local, realizado no espaço envolvente ao salão. A área da feira semanal passou, assim, a ter estacionamento de apoio à festa.

E eis que a Feira de São Bernardo assume os “moldes” atuais, continuando a ter presente a “herança” das primeiras edições. As barracas de venda de peixe deram lugar às rulotes de farturas, mas as tendas de jogos da sorte ainda hoje marcam presença. Os ranchos folclóricos continuam a subir ao palco e as famosas bancas de venda de “limonada fresquinha e saudável” deram lugar às rulotes de algodão doce e pipocas. Mas, a magia de ir à Feira de São Bernardo é a mesma de séculos.

No rossio, na Quinta da Gafa, na Cova da Onça, junto às margens do rio ou no MercoAlcobaça, com ou sem concertos, com mais ou menos inovações, a Feira de São Bernardo continua a ser o ponto de encontro de milhares de alcobacenses e uma das maiores festas do concelho. Este ano, e pela primeira vez em séculos, não houve certame. Mas, quando houver condições, é certo que os alcobacenses rumarão, de novo, religiosamente, à feira.  

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