As recentes conclusões do estudo realizado pela Organização Mundial da Saúde dão conta daquilo que já observamos na prática clínica, e que torna imperativo refletirmos: o estado mental e psicológico dos adolescentes está mais debilitado, atribuindo-se muito desse estado à pandemia.
Há um acréscimo de diagnósticos de ansiedade e depressão nos adolescentes, e de sintomas como dificuldades em dormir, dificuldades ao nível da socialização (sentimento de pertença) e um maior sentimento de infelicidade. Esse sentimento é que o mais tem caracterizado a procura à consulta de psicologia. A determinado momento da vida, adulta, do individuo é normal questionar-se sobre a sua vida, sentimento de vazio e desejo de inexistência, no entanto, é catastrófico haver adolescentes com esse sentimento. O adulto poderá passar por esse momento como algo renovador, a oportunidade de mudança para uma existência com sentido, o adolescente não tem a vivência nem a maturidade para essa transformação: há só um “nada”. Atente-se: num e noutro caso é importante o apoio psicológico/psicoterapêutico.
Comparativamente com o estudo realizado em 2018, há também um maior sentimento dos jovens de menor apoio familiar e maior perceção de que estão sozinhos. Em 2020, quando confinamos, alguém me questionou “achas que os jovens vão desenvolver perturbações como ansiedade e ficar mal?” Respondi: “com muita probabilidade desenvolverão maiores níveis de ansiedade e de outras perturbações, no entanto, tudo terá a ver como está a ‘saúde mental e relacional’ dessa família, como é a relação com os pais, como esses pais estão ao nível da sua própria saúde psicológica e se relacionam no seio familiar”. A verdade, é que os dados apresentados sobre os adolescentes poderiam ser apresentados sobre os adultos: mais ansiedade, mais depressão, mais tendência ao isolamento, mais desconexão, muito mais ligação às redes sociais.
O adolescente é, muitas vezes, o reflexo do que se passa, ou MASCARA, no seio familiar, aquilo que é óbvio, e sobretudo, o que não é óbvio no seio familiar, a forma como cada um dos elementos vive a sua vida, como está psicologicamente e como se relacionam entre si. Por vezes, é o adolescente que revela problemas psicológicos ou psiquiátricos, mas o cesto total (família) está doente na sua forma de interação. Presos nas suas próprias angústias, estados depressivos mascarados – ou não -, frustrações de uma vida corrida ou vazia, ou simplesmente num deixa-andar acutilante para adolescentes que precisam ser olhados e sentidos.
Quantas das famílias (pais) se sentam num final do dia para estarem na sala com os seus filhos? Quantos conversam realmente sobre os seus dias, mais do que questionamentos e pressões? Quantos tentam ver e perceber que “coisas” andam eles a ver, a acompanhar nas redes sociais e nas “Netflix desta vida”? Há um mundo incontrolável fora de cada casa: a internet. Não há como conseguir-se controlar todas as conversas, o mundo que se passa em cada adolescente com acesso à internet. Há mundos paralelos a acontecer em cada um, seria pedir o impossível que os pais conseguissem controlar isso. Mas é possível, pelo menos, ir estando atento, conversar, para que possam por algum tempo não estar presos ao consumo viciante às redes e aplicações. Manter regras em casa, sobretudo do não uso das tecnologias antes de ir dormir.
Este não é um problema dos adolescentes: é de uma sociedade, de cada um de nós. Acordar para a vida, implica querer saber de si mesmo, responsabilizar-se e não permitir achar-se que os outros ou alguém tem que determinar o que quer fazer da sua vida. Quando os adolescentes tiverem como referência adultos com identidade, com responsabilidade pelas escolhas que fazem, mais autênticos, talvez se sintam mais seguros, protegidos, e a saber que podem confiar, porque da mesma forma que esses adultos têm consciência de si mesmos, liderem pela referência.