Há 25 anos fazia-se história em Alcobaça. Nos dias 19, 20 e 21 de novembro de 1999 decorria, numa tenda gigante instalada em frente ao Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça, a primeira Mostra Internacional de Doces & Licores Conventuais, um evento que acabaria por deixar a sua marca na cidade logo desde o primeiro dia e que celebra 25 anos na edição que inicia hoje.
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O REGIÃO DE CISTER abriu o “baú” das memórias e recuou esse mesmo quarto de século para recordar a primeira vez que Alcobaça viveu e saboreou a Mostra de Doces & Licores Conventuais. Alcina Gonçalves, à época vereadora da Cultura de um executivo liderado pelo presidente José Gonçalves Sapinho, foi um dos primeiros “cérebros” responsáveis pela realização do evento. A antiga autarca relembra que o êxito do certame foi imediato e comprova-o com o que viu ainda antes de… entrar. “Fui buscar a minha mãe para ver a Mostra. Quando cheguei à tenda, queria entrar e não conseguia”, descreve. Alcina Gonçalves explica que foi necessário encontrar uma solução para lidar com a grande afluência de público. “A determinado momento, tivemos de controlar a entrada. Chegavam grupos de 20 e saíam outros 20”, recorda. O sucesso da primeira Mostra também foi, naturalmente, noticiado pelo REGIÃO DE CISTER. Na edição de 25 de novembro de 1999, o semanário dos concelhos de Alcobaça, Nazaré e Porto de Mós descrevia o ambiente vivido no último dia da primeira edição. “Tratando-se de um domingo, o número de visitantes aumentou, sendo quase impossível transitar no recinto e, até nas ruas que circundam o Rossio, o trânsito tornou-se caótico”, podia ler-se nas páginas do jornal.
Os motivos do êxito eram claros. Além de ser uma grande novidade no concelho, a entrada era gratuita e o conteúdo era apelativo. Alcina Gonçalves destaca ainda o falecido “chef Silva” como um dos grandes responsáveis pelo êxito imediato da Mostra, pela importância que teve na divulgação do evento. “Foi um senhor com muita projeção mediática e que levou os doces para a televisão”, conta a antiga vereadora, especificando que eram “organizados autocarros com membros do executivo, habitantes de Alcobaça e pastelarias que se destinavam a marcar presença em programas televisivos”.
A ideia para realizar a primeira Mostra de Doces & Licores Conventuais surgiu, curiosamente, no mesmo local onde foi impulsionada a doçaria conventual no concelho, o Mosteiro de Santa Maria de Coz. “No início do mandato, visitámos este monumento porque constituía um património importantíssimo e estava muito degradado”, começa por contar Alcina Gonçalves. “Na visita estava presente um professor de história e começámos numa conversa sobre as monjas, a lenda do pão-de-ló de Alfeizerão e outros temas relacionados. Na viagem de regresso para Alcobaça, concordámos que era uma excelente ideia fazermos uma feira envolvendo a temática da doçaria conventual”, acrescenta a atual empresária.
Com o “mote” a surgir a partir daquela conversa após a visita ao Mosteiro de Coz (no início de 1998), a organização definiu as “linhas-guia” do projeto, e, contando com a colaboração da extinta Região de Turismo de Leiria/Fátima [à época presidida por Francisco Vieira], efetuou diligências para colocar o plano em marcha. “Analisámos a Carta Europeia de Abadias e Sítios Cistercienses e fizemos um trabalho de pesquisa”, conta Alcina Gonçalves. “Procurámos por mosteiros que ainda preservassem a doçaria conventual e chegámos mesmo a deslocarmo-nos a várias regiões de Portugal e Espanha para convencer as ordens religiosas a marcar presença no evento”, salienta.
Desde a primeira Mostra que existiu o interesse de internacionalizar o evento, através da presença de mosteiros cistercienses do estrangeiro, contudo, este desejo só iria concretizar-se nas edições seguintes. Ainda assim, na estreia, o certame recebeu três dezenas de expositores nacionais, numa tenda gigante que representou o único investimento da autarquia – 2 mil e trezentos contos (na altura), cerca de 11,5 mil euros na moeda atual. Esta edição ficou também marcada pela presença da então primeira-dama, Maria José Ritta.
Nas edições seguintes, a localização da feira alternou entre as frentes do Mosteiro e dos Paços do Concelho. Em 2004, foi acrescentado um dia ao evento e, em 2006, a Mostra estabilizou-se definitivamente no interior do Mosteiro. “Desde o início que queríamos que fosse esta a localização porque faria todo o sentido realizar uma feira conventual dentro de um monumento da cidade que, além de estar relacionado com a doçaria conventual, era um local de grande atração turística, considerado Património Mundial”, revela Alcina Gonçalves. O desejo só viria a concretizar-se em 2006, pela mão de Rui Rasquilho, então diretor do Mosteiro de Alcobaça, que abriu a porta do monumento à Mostra de Doces & Licores Conventuais pela primeira vez. O sucesso foi enorme.
A partir deste momento, os moldes do evento não sofreram grandes alterações. Em 2007, começou a pagar-se entrada – 1 euro por dia ou 2,5 euros pelos quatro dias, valor que ainda se mantém. Em 2013, a Mostra recebeu pela primeira vez as únicas monjas cistercienses residentes em Portugal. As três irmãs, Fátima, Conceição e Francisca, do Mosteiro de São Bento da Porta Aberta, no Gerês, vão voltar a marcar presença nas bodas de prata do evento. Em 2015, introduziu-se o espetáculo video mapping, que acompanhou o programa do certame até à última edição. Em 2020 e 2021, os moldes foram, forçosamente, alterados devido às restrições da Covid-19. Nestes dois anos, a “festa” celebrou-se nas casas alcobacenses com tradição na Mostra. Destaque ainda para a última edição, em 2022, que coincidiu com a inauguração do Montebelo Mosteiro de Alcobaça Historic Hotel, que cedeu o espaço do Claustro do Rachadouro.
Hoje, inicia-se uma edição celebrativa que presta homenagem aos 25 anos de um evento considerado uma das “bandeiras” de Alcobaça. Alcina Gonçalves afirma que ver a Mostra de pé após um quarto de século é “um motivo de enorme orgulho”, mas frisa que é importante não deixar a qualidade cair e aumentar a aposta em mosteiros internacionais. “São entidades que conferem autenticidade ao evento e que lhes dão uma dimensão e um prestígio maior”, justifica.
Nos próximos quatro dias, Alcobaça volta a ser a capital dos doces e licores conventuais. São esperadas mais de 30 mil pessoas que terão cerca de 300 iguarias à disposição para degustar. Que seja uma edição tão (ou ainda mais) marcante como foi a de 1999!
“Parabéns, Mostra!”
Mostra abriu novos horizontes às casas alcobacenses
A Mostra de Doces & Licores Conventuais teve um grande impacto logo à partida, mas não foi apenas um sucesso para o município. A iniciativa foi também muito positiva para as casas alcobacenses, que já se dedicavam à confeção e à venda de doces e licores conventuais, impulsionando o negócio no setor.
Paula Alves gere a Pastelaria Alcôa, uma das marcas que participou em todas as edições, tendo arrecadado inúmeros prémios na categoria de “Melhor Doce”, no concurso promovido pela Mostra. A empresária elogia toda a organização do evento e refere que é uma data que orgulha a Pastelaria Alcôa. “É gratificante olhar para trás e ver todo o trajeto percorrido e a evolução que tivemos ao longo destes anos”, confessa a empresária. Paula Alves recorda também com emoção “pessoas que já não estão cá, mas que foram importantes para o evento”, bem como todos os “momentos especiais vividos”.
A primeira Mostra “foi uma grande surpresa para as pessoas de Alcobaça e do País”. Quem o diz é Vasco Gomes, o atual detentor da marca ”Ginja MSR”, também uma totalista na Mostra de Doces & Licores Conventuais. O responsável refere ainda que as primeiras edições foram as que mais pessoas mobilizaram. Esta grande afluência, logo em 1999, tem, segundo Paula Alves, um grande responsável. “O chef Silva foi o impulsionador deste evento. Ele tinha uma grande reputação, muitos conhecimentos e uma visibilidade enorme. Trouxe as televisões e muito público a Alcobaça”, justifica, acrescentando também que todas as restantes entidades envolvidas “fizeram muito bem o trabalho que lhes competia em prol do evento”.
Volvidos 25 anos, a opinião sobre o impacto da Mostra nestas entidades é unânime: o evento abriu novas portas dentro de um mercado que já existia, mas que não tinha a dimensão nem o reconhecimento da qualidade que tem hoje.
Apesar de reconhecer a importância do certame no e para o concelho, Vasco Gomes defende que existe espaço para elevar a Mostra para outro patamar no futuro. “O evento poderia realizar-se entre Alcobaça e cidades como Porto e Lisboa para trazer mais gente para cá no futuro”, começa por explicar. “A divulgação tem de ser maior. Tem de existir um conjunto de eventos durante os dias da Mostra que atraia mais pessoas. Alcobaça foi pioneira a fazer uma feira deste tipo, mas, atualmente, já há doces e licores conventuais em todo o lado. É necessário fazer mais alguma coisa”, finaliza.
Hoje inicia uma edição especial que conta com a presença de 12 participantes de Alcobaça.