O tempo é o do Verão Quente, em 1975, após o 25 de Abril, num momento em que centenas de mulheres pataienses tinham caído no desemprego, com o fim da empalhação de garrafas. É através da obra do historiador Tiago Inácio, lançada no passado dia 17 de maio, no decorrer das Festas da Vila de Pataias, que é dada a conhecer a luta no feminino para instalar aquela que foi a primeira fábrica da zona industrial da Alva.
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A história de “Memórias da Nutifruta” envolve um retornado de Moçambique, a prima que o liga a Pataias, e uma multidão a sair do rossio de Pataias, munida de ferramentas, rumo à zona de floresta onde hoje se encontra o núcleo de empresas do Alva Park. Cortaram as árvores, de forma ilegal, sem que a GNR interviesse, pondo fim ao impasse do Estado, dono das árvores, que não avançava com a autorização para ali instalar uma indústria. A fábrica de conservas de frutas acabaria por vingar menos de duas décadas, apesar das vicissitudes e do fim, inglório, que acabaria por protagonizar.
“É um livro que fala do período quente pós 25 de Abril e de uma empresa que nasce por vontade das mulheres”, sublinhou Tiago Inácio, que lembra que o movimento operário era uma realidade por todo o País e em Pataias teve a particularidade de ser feminino.
“Um jovem da Burinhosa que tem feito trabalhos magníficos sobre a história local. São memórias da nossa cultura e das nossas gentes. É um livro que diz muito a Pataias. Foi uma empresa que marcou Pataias porque as mulheres não tiveram de sair da sua terra para terem emprego”, elogiou o presidente da Câmara, Hermínio Rodrigues, que recordou que, quando era criança, via, na Avenida Rainha Santa Isabel, as trabalhadoras da Nutifruta a passar diariamente, de bicicleta, rumo à unidade fabril.
Na mesma sessão, foi lançado o livro “No Pedestal da Vida”, uma autobiografia de António Santos, o pioneiro da arte da imobilidade, conhecido como Homem Estátua ou Staticman. Tal como o livro de Tiago, a obra do pisoense foi financiada pela Junta e pela Câmara. Nela, António Santos relata o percurso desde o primeiro dia do resto da sua vida — aquele em que sintomas de uma doença, a desistência de um curso superior em Coimbra e o abandono do trabalho no hospital o acabariam por levar à descoberta da sua vocação e aos palcos do mundo inteiro. Pelo caminho, muitas peripécias e episódios para rir, alguns relatos de sofrimento e outros tantos momentos de clarividência.
“Ser estátua é duro”, confessou António Santos, vestido de estátua, numa representação de si mesmo. Num discurso gravado, o Staticman enumerou as muitas dezenas de destinos onde já atuou, deixou elogios aos apoios da Junta e da Câmara e verbalizou o que escreveu no livro, no capítulo “Testamento”: que, após a morte, o seu corpo integre o museu dos Pisões. “Estátua morta, em memória de todas as estátuas vivas”, pediu o artista. “Tem sido um orgulho ver o crescimento do António, um homem do mundo. Levou o nome dos Pisões, de Pataias, de Alcobaça, de Portugal ao mundo inteiro”, enalteceu o presidente da Câmara, que deixou o convite para uma visita ao Statua Museu das Estátuas Vivas.
Valter Ribeiro também não poupou elogios aos autores e às suas criações, aproveitando o momento para deixar um extenso rol de agradecimentos, na sessão solene daquelas que foram as últimas Festas da Vila enquanto presidente da União de Freguesias de Pataias e Martingança.