O avô Luís abriu o negócio em 1926, num conceito muito comum na época: taberna e mercearia.
O avô Luís abriu o negócio em 1926, num conceito muito comum na época: taberna e mercearia. Da taberna apenas restam memórias, nomeadamente dos “pirolitos” que ali se bebiam ao domingo, antes da missa, mas a mercearia “O Ferreira”, a mais antiga da Benedita, está à beira de cumprir um século de portas abertas, depois de um longo percurso liderado pelo filho Joaquim entre 1969 e 2001 e, até aos nossos dias, pelo neto Romeu.
O herdeiro voltou a casa após a morte do pai para “manter vivo” o negócio da família, abdicando da carreira que estava a construir depois da licenciatura em Sistemas de Indicação Geográfica e por uma razão simples. “Gosto de ser feliz. E sou feliz aqui”, assume, com um sorriso sincero.
Romeu Ferreira é o novo rosto da mercearia da Rua da Serradinha, mas não abdica da presença diária da mãe, Ana, que carrega consigo décadas de experiência de lidar com o público. Quando chegou, o comerciante tentou dar um cunho pessoal a uma loja que é a mesma há 93 anos, “mas nem sequer estava identificado enquanto mercearia”. Sob a sua gerência, criou, pela primeira vez, um toldo para identificar o estabelecimento comercial, escolhendo como lema “Desde 1926 para o bem servir”. Hoje, apresenta mais de 6 mil artigos à disposição dos clientes, alguns dos quais chegam de destinos tão improváveis como Rio Maior ou Lisboa.
No último século, o hábito de comprar rebuçados no “Ferreira da Benedita ao pé da igreja” passou a ser tão normal como encontrar ali acafrão das Índias, açúcar de côco, açafrão dos Açores e outros produtos regionais difíceis de vislumbrar noutras superfícies comerciais. O aspeto humano é a grande mais-valia da loja.
“Temos clientes que vêm cá há 70 anos e há alguns que não nos trocam, mesmo sabendo que não somos competitivos pelo preço. Há clientes fiéis que pedem aos filhos para as virem trazer à nossa loja, porque sabem que aqui há proximidade. Quase um psicólogo”, justifica Romeu Ferreira, que serve muitos beneditenses, mas também clientes de outras paragens. Nomeadamente um cozinheiro de um restaurante em Barcelona que lhe encomenda produtos que não encontra em mais lado nenhum. “Ele faz os pedidos por e-mail e os produtos seguem pelo correio. É um caso curioso”, reconhece o homem que, agora, é “O Ferreira” e mantém vivo o património da família e da própria vila da Benedita.
De resto, quem entra naquela mercearia pode encontrar, entre os 6 mil artigos expostos e centenas de vinhos diferentes, objetos que não deixam dúvidas sobre a história que ali se respira. Desde a balança usada desde os anos mais remotos até uma máquina registadora que funcionava à manivela quando faltava a luz. O que ali não falta é “proximidade e amizade com os clientes”. Produtos essenciais para manter vivo um negócio secular.