João Lucas é um nome indelével na história do futebol português. Falecido em 2015, vítima de morte súbita, o alcobacense foi (uma vez mais) homenageado pelos seus pares. O Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol prestou um tributo ao malogrado, na passada quinta-feira, inaugurando o auditório João Lucas no Campus do Jogador, em Odivelas. O espaço pretende homenagear, a título póstumo, o jogador, que se iniciou no Ginásio e que representou, entre outros, Académica e Boavista, mas que, nos últimos anos de vida, concentrou as suas forças na missão de delegado do Sindicato dos Jogadores, cargo que desempenhou entre 2007 e 2015.
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A inauguração daquele espaço juntou figuras de proa do futebol português, assim como a família do alcobacense e alguns dos amigos mais próximos do antigo futebolista. “O João Lucas tinha três dimensões: a humana, o delegado e o jogador de futebol. Para nós, Sindicato dos Jogadores, a marca que fica é o seu sorriso e a sua empatia. O João tinha uma energia contagiante, era um facilitador e um grande comunicador. O que mais se destacava no Lucas era a solidariedade e a generosidade e é essa memória que queremos preservar ao deixar o seu nome associado a este auditório”, referiu o presidente do Sindicato dos Jogadores, destacando o legado que o alcobacense deixou. “Infelizmente terminou a carreira mais cedo, pelas circunstâncias que sabemos, mas deixou uma identidade pelos clubes onde passou. Não foi um ídolo, mas não tenho dúvidas de que está no coração de todos porque, com pequenos gestos, fazia a diferença”, enalteceu Joaquim Evangelista, explicando a atribuição do nome do antigo médio ao auditório. “Este é um espaço multidisciplinar que faz a ligação entre o desporto e a comunidade e, tendo o Lucas essa dimensão humana, faz todo o sentido que o principal auditório do Campus tenha o seu nome”, notou o dirigente.
João Vieira Pinto, agora dirigente na Federação Portuguesa de Futebol, partilhou o balneário com o alcobacense no Boavista (entre 2004 e 2006) e não se imiscuiu de falar do colega e amigo: “É, para mim, uma grande satisfação ter este auditório com o nome de um ex-jogador, mas sobretudo de um grande amigo. O Lucas foi um grande parceiro e colega. É alguém que deixa muitas saudades, pela sua forma de ser e pela solidariedade que tinha como pessoa e dentro de campo. Era um guerreiro e um lutador como jogador. Não fizemos mais do que a nossa obrigação ao integrá-lo na equipa do sindicato e estou muito orgulhoso de ver este auditório com o seu nome. O futebol não esquece e o sindicato não esquece os jogadores”, disse o antigo internacional português.
Num momento emotivo como este, foi a irmã [Íris Guerra] que tomou a palavra. “Agradeço esta bonita homenagem que o sindicato faz ao nosso João Lucas, para eternizar a sua memória. O João congregava as pessoas à sua volta, entregava-se às suas causas e tinha uma responsabilidade ética enorme. Esperamos que, daqui em diante, este auditório possa ser um espaço de debate de ideias e de construção de boas práticas no desporto e no futebol”, sublinhou.
O momento simbólico contou com personalidades distintas – desde logo com o presidente da Federação Portuguesa de Futebol, Fernando Gomes, o vereador do desporto da Câmara de Odivelas, Francisco Baptista, representantes da Liga Portugal, Ginásio, Académica e Boavista, antigos colegas e treinadores –, mas houve amigos que também fizeram questão de marcar presença neste tributo.
Noel Delgado, Miguel Pinheiro e Leandro Santos, amigos de João Lucas, deslocaram-se até Odivelas e também não contiveram as emoções. “O presidente do sindicato caracterizou o João como pessoa, atleta e depois de atleta. Ele tinha essas três vertentes. Para os que o conheciam como nós, era um grande amigo e um atleta de excelência, e mais tarde, juntou tudo isso ao serviço do sindicato. É um exemplo e uma homenagem justa. Associar o nome do João a um auditório desta grandeza, que vai servir para estudos, conferências… se o João fosse o vivo era de lhe dar os parabéns”, disse Noel Delgado ao REGIÃO DE CISTER, sendo o porta-voz do trio que conviveu e partilhou inúmeras alegrias com João Lucas.
“Colocando de lado a amizade que tinha com o João, ele marcou as gerações que viveram com ele. Foi o primeiro grande nome a surgir no Ginásio na geração dele e o primeiro desse lote a sair de Alcobaça para chegar a um campeonato com um nível altíssimo. Além de viver encostado ao estádio, de onde via a formação na varanda, fazia questão de dizer que era de Alcobaça e que tinha sido formado no Ginásio. Ele nunca esqueceu o clube onde quase nasceu e fez questão de manter sempre essa ligação. Ele alimentava o sonho das crianças sempre que vinha ao Municipal”, finalizou o técnico ginasista e amigo do saudoso João Lucas.
Sindicato cria bola de 5 mil euros para investigação
Um dos momentos altos da cerimónia de inauguração do auditório João Lucas foi o anúncio da criação, pelo Sindicato dos Jogadores Profissionais de Futebol, de uma bolsa de 5 mil euros para potenciar a investigação da saúde no desporto.
“É o reconhecimento público e a eternização do trabalho que o João fez enquanto Jogador e delegado do Sindicato e daquelas que foram as suas características distintivas e mais marcantes: a entrega, solidariedade, compromisso e responsabilidade ética”, começou por sublinhar a irmã ao REGIÃO DE CISTER. Íris Guerra explicou que a “prenda” foi consequência do “Projeto João Lucas – A vida está primeiro”, criado em conjunto com o SJPF em 2016, sendo que o objetivo passa por conseguir “fomentar a investigação em relação aos quadros cardíacos que envolvem a morte súbita na prática desportiva, sensibilizando os jogadores, clubes, organismos e instituições para esta realidade, definindo linhas orientadoras para a prevenção da morte súbita no desporto e desenvolver boas práticas que assegurem o diagnóstico precoce, tratamento, estudo e acompanhamento médico regular”. “Concomitantemente, será possível desenvolver medidas institucionais de proteção, enquadradas por regulamentação específica”, sublinhou a familiar de João Lucas. Dessa forma, a ideia passará por, em colaboração com a Ordem dos Médicos, atribuir a verba “a uma universidade ou faculdade de medicina, ou a um projeto de doutoramento que queira conduzir a presente investigação”.
A psicóloga e psicoterapeuta sublinhou que a referida bolsa vai “trazer para o terreno” o projeto lançado em 2016 e que servirá para dar início a uma maior investigação sobre a morte súbita que permita prevenir este fenómeno na prática desportiva. “Que vá produzindo resultados que revertam a favor de melhores políticas de proteção e respostas institucionais, médicas e desportivas. A morte súbita cardíaca é a principal causa de morte em atletas durante a prática desportiva, sendo o exercício físico regular apontado como uma das estratégias de sucesso para a prevenção das doenças cardíacas”, nota. “O risco de morte parece aumentar 2-4,5 vezes durante a prática de atividade física de alta intensidade regularmente”, analisou a alcobacense, notando que a aposta na investigação desta temática trata-se de uma “bela homenagem à história de vida do irmão”, um cidadão que, como sublinhou, “desde o conhecimento do seu diagnóstico (Displasia Arritmogénica) e consequente decisão de abandonar a carreira em 2008, manteve sempre uma sólida preocupação com a questão da saúde aliada à prática desportiva de alto rendimento.