Sexta-feira, Dezembro 13, 2024
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Os poemas que permitem a Manuel Gonçalves ganhar asas e voar

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Publicar um livro de poesia aos 22 anos não é para todos, mas Manuel Gonçalves, que escreve poemas desde os 11 anos, conseguiu mais um objetivo numa vida que, desde muito cedo, ficou marcada pela trissomia 21. “Abri as minhas asas… e voei” é o título da obra, carregada de afetos.

Publicar um livro de poesia aos 22 anos não é para todos, mas Manuel Gonçalves, que escreve poemas desde os 11 anos, conseguiu mais um objetivo numa vida que, desde muito cedo, ficou marcada pela trissomia 21. “Abri as minhas asas… e voei” é o título da obra, carregada de afetos.

Tudo o inspira a escrever um poema: o tempo, um desabafo, coisas boas e coisas más. “Quando estou triste preciso de desabafar para o papel. Mesmo sabendo que a minha mãe está ali a querer ouvir, prefiro o papel porque não tem boca para perguntar mais nada”, explica o jovem. Mas vamos por partes. 

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Manuel Gonçalves cedo começou a escrever poesia. “Uma professora substituta, na época, dava matéria na primeira parte da aula e, na outra, dava poesia”. Assim começou um “amor” que dura até hoje. “Escreve-se e entende-se o que se escreve, o que dá uma sensação de alívio no fim”, relata o poeta. “Gosto mais de escrever nos dias de hoje do que aos 11 anos. Sinto-me livre, é como se ganhasse 30 mil pares de asas”, compara o jovem, com o sentido de humor, que lhe é característico. “O sentido de humor nasceu comigo. Foi uma coisa divina… ou uns ‘genezinhos’ do avô Rui”, de quem herdou, também, o charme, assegura. E gosta de sair à noite com os amigos que cultiva.

Apesar do gosto pelas palavras, não vive apenas de poesia. É um amante de cavalos desde os 6 anos, elege o ski aquático como o desporto favorito e ouve fado para lhe encher a alma. “Uma boa tourada, um bom copo de vinho e uma boa conversa” também constam na lista. Além disso, também gosta de… namorar. “Conheci a minha namorada em Alcântara, numa escola de atores. Quando a vi, apaixonei-me e ela apaixonou-se por mim”, conta, sorrindo. “Estávamos os dois a fazer um workshop de teatro e fui eu que dei o primeiro passo. No nosso último encontro na escola, ela estava a chorar porque pensava que não nos íamos ver mais e eu fui lá consolá-la: dei-lhe um beijinho”. 

Quanto ao livro, que lançou no passado dia 25 de março, durante o 7.º Encontro de “Famílias 21”, em Alcobaça, Manuel tem ideias que gosta de deixar bem definidas. “Os poemas são meus, fui eu que os fiz. Se quiserem, acreditem, se não quiserem… É igual para mim. Tive ajuda da minha mãe, não a escrever, mas a recolher os poemas ao longo dos anos, que fui espalhando pela casa toda”, revela. 
A obra, que inclui 50 poemas da sua autoria, foi lançada com o principal objetivo de “dizer a todos que as pessoas com trissomia 21 podem voar, com as oportunidades que lhe possam dar”. Na opinião do autor do livro, os pais devem “insistir e acreditar nos filhos, tenham ou não deficiências”.

Manuel tem um curso de guia auxiliar de hipoterapia. Este método terapêutico com cavalos “ajuda a tratar deficiências mentais, motoras, trissomia 21 ou surdez, por exemplo”. “Quanto à postura, dá para desenvolver os músculos e solucionar deformações ósseas. A nível mental, a relação com o cavalo ajuda a acalmar a pessoa”, explica o “especialista”.

Na poesia, identifica as próprias emoções e deixa no papel as frustrações, o amor que lhe transborda e o sentido de humor. Entre estrofes, lê-se a saudade de quem já partiu, como é o caso do poema que dedica ao irmão Henrique. “A pessoa vai, mas fica aqui comigo. Quando fecho os olhos sonho que o meu irmão está de mão dada comigo. De manhã, quando acordo, já não está lá. Sinto a falta dele, mas não faz mal. Eu sou como a fénix, renasço das cinzas”, assevera. É católico. Acredita em Deus e tem fé.

A gratidão dedicada àqueles que estão consigo diariamente também se lê noutros poemas, inspirados frequentemente na mãe Constança. “A mãe é mais velha e tem de se respeitar muito. Sinto que ela me disse que não quando devia de dizer ‘não’ e ‘sim’ quando devia dizer que sim, mas sempre com um sorriso nos lábios. Soube intercalar a educação com a maneira de ser doce e amigável”, fundamenta. “Ela é uma peça muito importante na minha vida. Às vezes, quando lhe quero pedir alguma coisa digo: ‘oh mãezinha queridinha do meu coração…’”, conta, entre gargalhadas.

São Martinho do Porto, onde vive, também inspira o jovem a escrever, principalmente quando vai à janela “para apanhar um bocadinho de sol” e acaba a contemplar o mar. Apesar de viver numa vila pacata, o escritor admite que adora movimento. “Eu sou aquela pessoa que nunca para no mesmo sítio. Às vezes vou para Foz do Arelho, ou para o Alentejo e outras fico por São Martinho”. 

Voltando ao livro, Manuel Gonçalves não pode deixar de fazer referência ao prefácio do seu livro, escrito por Marcelo Rebelo de Sousa. “É uma pessoa que me inspira. No dia a dia é uma pessoa simples e junta-se ao ‘povo’. Na minha opinião, um Presidente da República deve fazer isso. É uma pessoa fantástica”, avança o escritor, que simboliza o melhor exemplo de que o acreditar pode, efetivamente, fazer diferença. E, assim, ganhar asas… e voar.

Jovem é o primeiro escritor com trissomia 21 a publicar um livro em Portugal

A obra só saiu à rua no mês passado, mas Manuel Gonçalves tem por lá poemas que já datam de uma década. O jovem escreve poesia desde 2004 e foi a partir desse ano que a mãe começou a guardar os pensamentos que o filho escrevia no papel. De acordo com a Associação “Pais 21”, de Lisboa, este é o primeiro livro lançado em Portugal escrito por um deficiente com trissomia 21. 
“O próximo está no segredo dos deuses”, adiantou o jovem, de 22 anos.

 

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