Foi em março de 2018 que Hugo Rebelo recebeu um telefonema que lhe transformou a vida. Em 2012, tinha participado na campanha, em Alcobaça, de angariação de doadores de medula óssea em favor de Bruno Fonseca, mas, como tantos outros, não seria escolhido e quase até esquecera o facto de que constava na base de dados da Associação Portuguesa de Luta Contra a Leucemia. Até que foi contactado, pois havia uma compatibilidade com um doente. Sem olhar para trás, o alcobacense decidiu fazer o bem (mesmo) sem olhar a quem, pois, passado um ano da doação, ainda não sabe a quem ajudou a salvar a vida.
Foi em março de 2018 que Hugo Rebelo recebeu um telefonema que lhe transformou a vida. Em 2012, tinha participado na campanha, em Alcobaça, de angariação de doadores de medula óssea em favor de Bruno Fonseca, mas, como tantos outros, não seria escolhido e quase até esquecera o facto de que constava na base de dados da Associação Portuguesa de Luta Contra a Leucemia. Até que foi contactado, pois havia uma compatibilidade com um doente. Sem olhar para trás, o alcobacense decidiu fazer o bem (mesmo) sem olhar a quem, pois, passado um ano da doação, ainda não sabe a quem ajudou a salvar a vida.
“Foi tudo bastante rápido. Fui dado, juntamente com mais cinco pessoas, como compatível e fiz análises em Alcobaça. Em julho fui contactado a dizer que era o mais compatível de todos”, recorda o agente de seguros, que foi de férias e em setembro começou a fazer uma bateria de exames para se preparar para o transplante, que inicialmente ficou marcada para outubro. Só que o recetor apanhou uma gripe e a recolha foi adiada para 25 de novembro. Fez há dias um ano e nunca pensou em desistir.
“Quero desmitificar isto, porque infelizmente há muitas pessoas que se recusam a doar a medula quando são escolhidas. Sempre tive a intenção de dar a medula e quando fui escolhido nem hesitei. É um motivo de orgulho e não de preocupação”, nota o doador, que foi informado pelos médicos de “todos os cenários” e começaram “pelos piores”. “Em todas as intervenções médicas existe risco, mas isto é tudo indolor. A única parte mais chata é estarmos cinco horas sem nos mexermos, mas podemos dormir ou ver televisão, sendo que o nosso conforto é o mais importante para o corpo clínico. De cinco em cinco minutos perguntavam-me se estava bem”, salienta. “Se algo não estiver bem da nossa parte o processo é imediatamente interrompido. A forma como nos tratam é incrível. Todos os médicos sabiam o meu nome e faziam questão de me agradecer o gesto”, sublinha o homem, de 42 anos, que assume ter ficado “em paz” quando saiu da Unidade de Tratamento da Medula Óssea do Hospital de Santa Maria em Lisboa: “Creio que não fiz nada de mais, pois sei que as pessoas que conheço seriam capazes de fazer o mesmo. Penso que fui um privilegiado. Vivi uma sensação única e, no hospital, a forma como nos tratam, é indescritível”.
O alcobacense ainda não foi pai, pelo que a pergunta se impõe. Será que ajudar alguém a sobreviver, através deste processo de doação de de medula, está na mesma medida de ser pai? Hugo Rebelo assume que não sabe, mas acredita que “deve estar muito perto disso”. “É uma sensação de felicidade que não é fácil descrever”, frisa Hugo Rebelo, não escondendo que ficou marcado “por uma história em particular”, das muitas que lhe contaram no hospital, sobre o caso de dois irmãos, em que um “se recusou a doar a medula, só por medo”. “Há muitas pessoas que são escolhidas para doar, mas não o fazem. Só que não se sabe, porque estão em silêncio”, sustenta.
Durante três anos, o doador “não pode voltar a dar a medula a mais ninguém”, porque a pessoa está dependente dela e o doador pode ser chamado a qualquer momento para dar mais sangue. “Quem for selecionado tem de perceber que é um privilegiado. A forma como tudo se vai desenrolar é um privilégio. A esperança, os valores e as pessoas que nos rodeiam tornam este processo e todas as vivências inesquecíveis. Se pudesse dava medula todos os anos a pessoas diferentes”, brinca Hugo Rebelo, que teve o apoio da família desde a primeira tomada de decisão. “A minha mulher, Isabel, estava super emocionada e acompanhou-me sempre. Os meus pais tinham algum receio, mas disse-lhes que esta era uma operação e que em todas as operações há risco de vida, mas ele é mínimo. Felizmente, a minha família apoiou-me desde o início”, recorda.
Hugo Rebelo tinha direito a saber o sexo, nacionalidade e idade do recetor. Mas, passado um ano, continua sem saber quem ajudou num momento difícil. “Não é importante para mim saber quem é a pessoa, nem pretendo saber se sobreviveu. Obviamente, espero que tenha sobrevivido e seja uma pessoa feliz, porque gostava de ter a certeza de que valeu a pena todo este esforço. Mas, ao mesmo tempo, não quero saber, para não ficar desiludido caso algo tenha corrido mal”. Porque é assim que se pode, efetivamente, fazer o bem sem olhar (mesmo) a quem.