Agosto é conhecido por ser o mês querido dos emigrantes. Costuma ser sinónimo de almoços e convívios com os familiares, de horas nas esplanadas depois de mergulhos nas praias e de festas populares que “sabem” a frango assado e a farturas. Mas, este ano, com as tradições populares suspensas, devido à pandemia, regressar às origens não é certo.
Agosto é conhecido por ser o mês querido dos emigrantes. Costuma ser sinónimo de almoços e convívios com os familiares, de horas nas esplanadas depois de mergulhos nas praias e de festas populares que “sabem” a frango assado e a farturas. Mas, este ano, com as tradições populares suspensas, devido à pandemia, regressar às origens não é certo.
Pelo menos duas vezes por ano Odete Oliveira faz questão de regressar a casa. O Natal e o verão são épocas “sagradas” para esta alcobacense a residir em Londres há 13 anos. “No Natal não consigo ficar longe do nosso tradicional bacalhau e no verão… pelo menos uma semana tenho de vir cá para aproveitar o bom tempo que é tão raro em Londres”, revela a alcobacense ao REGIÃO DE CISTER.
A pandemia levou-a a considerar a pertinência e facilidade de viajar para fora do Reino Unido, uma vez que Portugal esteve até bem recentemente na “lista negra” dos “corredores aéreos” do Reino Unido. “Considerei se devia ou não marcar a viagem até ao último momento, mas decidi arriscar e vir apenas uma semana. Seria o primeiro verão, em 13 anos, em que não regressava a casa e a verdade é que Portugal, no que refere à pandemia, é um país mais seguro que o Reino Unido”, considera.
A viagem não foi cómoda e os cuidados tiveram de ser “triplicados” para garantir a sua segurança, assim como a daqueles que aguardavam o seu regresso. “Viajar de máscara é um desafio e em longas viagens chega a ser sufocante. E há sempre o receio de tocar nos objetos que nos rodeiam porque um simples erro pode pôr tudo a perder”, analisa Odete Oliveira, recordando que a estadia é feita em casa da mãe, que integra o grupo de risco no que refere à Covid-19.
E as mudanças não ficaram por aqui. Os vários almoços em casa dos amigos deram lugar a “tímidos” cafés em espaços públicos e arejados e conhecer o filho recém-nascido de uma amiga foi feito ao portão da casa. “Isto é o que mais me custa. Sou uma pessoa de abraços e de carinhos e neste momento tudo isto tem de ser evitado. Quero abraçar as minhas amigas, os filhos delas e ir jantar a um restaurante cheio de vida, numa noite de verão. É sinónimo de férias, mas este ano…”, lamenta.
Mas perante a situação é preciso procurar alternativas e tentar usufruir da melhor forma do tempo que estão em “casa”. Os convívios foram reduzidos para apenas os familiares mais próximos e para Odete Oliveira “é o suficiente”. Desde o início da pandemia, que a emigrante não se sentava à mesa com amigos e familiares para desfrutar de uma refeição. Muito menos de um prato com o peixe fresco da região.
E por isto, as férias atípicas já valeram a pena. “Temos de ser gratos pelas oportunidades que temos. Não é o agosto que estamos habituados, é verdade, mas tenho saúde e consegui ver aqueles que amo. Para o ano compenso com um agosto cheio de festa”, graceja.
Mas nem todos partilham deste positivismo e há quem tenha optado por adiar as férias de verão para o período “pós-pandemia”. A evolução da pandemia em Portugal não é o principal problema, mas sim o receio de infetar os familiares. É o caso de Ana Abreu, há cinco anos a viver em Ibiza.
A veterinária mudou-se para a ilha espanhola após terminar a licenciatura. Todos os anos, na segunda semana de agosto, a jovem de 24 anos regressa a Alcobaça e a data não é aleatória. O objetivo é estar na cidade aquando da Feira de São Bernardo, festividade que reúne em Alcobaça quase todos os amigos da jovem. “Desde muito novos que nos encontramos na feira.
É inevitável e tornou-se uma espécie de tradição e mesmo agora, adultos e espalhados pelos quatro cantos do mundo, tentamos marcar presença e comer um franguito juntos”, conta. Por isso, o cancelamento do certame foi a “gota de água” para Ana Abreu, que já tinha algumas dúvidas quanto à pertinência de regressar à cidade para as férias de verão. “O meu pai é doente crónico e morro de medo de ser responsável pela sua infeção. Obviamente que tenho vários cuidados, mas não podemos achar que só acontece aos outros”, desabafa.
Não foi fácil transmitir a “notícia” aos pais, que ficarão assim um ano sem ver a filha. Mas, apesar da saudade, compreendem a decisão. “Espanha tem sido um país muito maltratado pela pandemia. Assistimos a um decréscimo dos casos, mas a tendência está novamente a inverter. Portugal é um paraíso comparativamente a Espanha e sinto que seria eu a aumentar o risco por si só já existente em casa dos meus pais”, esclarece.
Deste modo, para Ana Abreu as férias em “casa” ficam “suspensas” para o próximo ano. Quando estiverem reunidas as condições para “um convívio na Feira de São Bernardo e um almoço de família em casa da avó”.
Este ano, agosto tem um sabor agridoce e já não é o mês mais querido do calendário. Para aqueles que arriscaram vir, a oportunidade de matar saudades da família, ainda que com restrições, vale a pena. Os que optaram por “jogar pelo seguro” e permanecer longe anseiam pelo fim da pandemia e pela segurança para regressar ao “ninho”.
Pandemia silenciou bailaricos e festas populares
A pandemia da Covid-19 virou o verão de pernas para o ar e obrigou ao cancelamento de dezenas de “bailaricos” e festas populares na região. Os músicos, as associações e os empresários do setor fazem contas à vida, pois o mês de agosto, que costuma ser o mais rentável do ano, trouxe um profundo e agonizante silêncio.
Por esta época, os foliões estariam a “descansar” da Feira de São Bernardo, em Alcobaça. Avizinhavam-se as Festas do Sítio, na Nazaré, que assinalam o início do mês de setembro e que antecedem a tradicional Festa da Fruta, na freguesia da Cela. Para trás teriam ficado tantas outras noites de convívio em certames como as Festas de São Pedro, em Porto de Mós, ou as Festas de Santo António, em São Martinho do Porto.
Mas este ano, os concertos dos cantores ligeiros bem conhecidos do público e que convidam sempre a um pé de baile foram todos cancelados devido à pandemia. Os artistas falam em prejuízos que atingem milhares de euros e que colocam em causa o futuro. O cancelamento de um concerto consiste na quebra de rendimentos também para técnicos e associações. Por sua vez, o adiamento de romarias e grandes certames, como é o caso de festas municipais, resulta também no decréscimo de turistas.
Segundo uma estimativa feita pela Comunidade Intermunicipal do Oeste, a região vai perder este verão mais de um milhão de visitantes e sofrer impactos económicos ainda não contabilizados devido ao cancelamento de festas, festivais e eventos até 30 de setembro. Só no presente mês, devido ao cancelamento da Feira de São Bernardo e do evento Aljubarrota Medieval estima-se que o concelho de Alcobaça tenha perdido cerca de 100 mil visitantes.
O impacto é tremendo e o Ministério refere que o trabalho é diário, em colaboração com a Direção-Geral da Saúde, para definir medidas adequadas a cada fase, para que tudo decorra em segurança e com confiança para público, artistas, técnicos, trabalhadores.
O Ministério da Cultura recorda, por outro lado, que o orçamento público para a cultura cresceu 40% nos últimos cinco anos e que, nesta altura, o investimento em políticas públicas é ainda mais urgente.
Ao flagelo económico associa-se o social. Agosto é por tradição o mês das romarias, dos emigrantes e dos convívios populares. Este ano, tudo isto terá de ficar para “depois”, adensando a incerteza que se vive em todo o País.
Os prejuízos estão ainda por avaliar na globalidade. Mas o cortejo da crise ameaça as perspetivas até final do ano de 2020. Para já, não há foguetes nem bailaricos populares no horizonte.