Habitação, melhoria de serviços e autonomia para as juntas de freguesia são apontadas como as principais bandeiras da candidatura da Iniciativa Liberal, partido que concorre pela segunda vez à Câmara de Alcobaça.
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REGIÃO DE CISTER (RC) > Vê na falta de experiência autárquica uma vantagem para a sua candidatura? Ou teme que o eleitorado entenda como uma desvantagem?
SANDRA LOURENÇO AMARO (SLA) > O facto de não ter experiência, não venho com os chamados “vícios”. Venho, literalmente, com um olhar diferente. A desvantagem surge exatamente por não ter essa experiência; posso ser vista como alguém que não será capaz de liderar o executivo. Mas, é uma questão de ir ganhando experiência para mostrar e provar que realmente também sou capaz. Quando me proponho a algo, entrego-me a esse novo projeto. Dedico-me 100% ao projeto e vou conseguindo aprender. Sei que sou uma pessoa capaz de lidar com pessoas. Consigo escutar. E nestas questões, um dos fatores fundamentais é escutar a população. Acredito que, ganhando o lugar como vereadora, com ou sem pelouro – ficando ao critério de quem ganhar a Câmara –, já será um ponto a favor para ganharmos mais experiência. É esse o caminho que pretendemos trilhar.
RC > Que motivos justificam a decisão de dar a cara pela IL nas próximas eleições?
SLA > Tive uma experiência não política. Foi a primeira vez na minha vida que fui a uma assembleia de freguesia e a uma assembleia municipal e que intervi. E fiquei um bocadinho chocada com a realidade que vi, que é o que vejo nalgumas pastas do meu setor profissional: estamos a falar muito para os mesmos. Chego a uma assembleia municipal, vejo a forma como funciona e penso “isto não tem nada a ver com o que as pessoas precisam no dia a dia”. Ao ter consciência disso, pensei que se quero fazer alguma mudança, tenho de fazer parte dessa mudança. A partir daí, comecei a pensar no que poderia fazer. De facto, é preciso uma ação política. E esse foi o pontapé de saída. Encontrei um partido político que se alinha com os meus valores pessoais. E a partir daí, faço o que posso. E como não tenho problema em expor-me, quero também mostrar que, mesmo uma pessoa sem experiência na política, pode e deve fazer parte destes cargos. Se queremos liberdade de expressão, temos de ser capazes de dar a cara por essa liberdade. E, sendo mulher, com filhos, temos de mostrar que é possível.
RC > O que mais a “chocou”?
SLA > Na assembleia municipal, há muitas intervenções que, na realidade, não acrescentam muito mais ao concelho. Mostra-se uma certa grandeza e pouco do que o concelho precisa que seja discutido em assembleia. O que faz com que o público, que podia e devia participar, não tenha vontade para isso. Peço desculpa pela expressão, mas apanhamos uma seca muito grande. Falo de uma certa inércia, que até consigo perceber porque existe. São precisas pessoas novas, sem experiências, sem vícios e sem medos.
RC > Foi a participação no movimento cívico ligado à Quinta da Serra na Benedita, que a levou às assembleias municipais e de freguesia, que a fez despertar para a política?
SLA > Sem dúvida. Antes disso, não tinha qualquer intenção. Comecei a olhar para a política por causa da minha área profissional. Sempre tive a minha veia ambientalista muito ativa e fui parar a um setor que é tido como contra ambiente, o setor de extração mineral. E a verdade é que parte do problema ambiental tem a ver com política. E a partir daí comecei a despertar para essa parte. Mas, em termos de ação política, só quando integrei o movimento que tentou preservar o que restava da Quinta da Serra e aí percebi que realmente é preciso sangue novo, sem esse ensinamento político.
RC > À exceção da sua candidatura e do PS, os candidatos são repetentes. Como pretende provar aos eleitores que a Iniciativa Liberal, apesar de ter uma curta história política no concelho, tem propostas concretas e soluções para os problemas de Alcobaça?
SLA > Estamos a preparar isso para a campanha, porque vai ligar muito com o programa político. Se conseguirmos dar mais autonomia às juntas para que consigam fazer o que identificam no território delas, a câmara fica liberta para outros temas mais abrangentes e com um olhar mais geral. Penso que isso poderá fazer a diferença em relação aos restantes candidatos. Mas, na altura do programa eleitoral, iremos também divulgar mais medidas concretas.
RC > Propõe-se lutar por um concelho onde “as populações tenham mais autonomia e não se sintam tão dependentes da câmara para coisas simples”. De que forma pode melhorar o funcionamento dos serviços municipais?
SLA > Existem os protocolos de transferência de competências. E melhorando esses protocolos tem de haver também o trabalho de capacitar as junta, seja com recursos, conhecimento ou financiamento, para que possam ser mais autónomas. Acreditamos fortemente que as juntas de freguesia, podendo ser mais autónomas, a decidir quando fazem o alcatroamento da estrada a, b ou c, criam melhores dinâmicas internas e isso vai-se provar ao nível do concelho. O trabalho da câmara é ajudar as juntas a ter essa autonomia e permitir que assim se dedique a outros assuntos. Atribuir responsabilidades às várias juntas e a câmara funcionar como um organismo de supervisão e de criação de sinergias. O nosso concelho é muito diverso e para conseguir que essa diversidade fervilhe, é preciso que cada junta tenha a sua autonomia. Esse é o início do caminho. As juntas acabam por estar muito dependentes das Câmaras. A população percebe isso. Já são décadas disto. E isso acaba, de forma não óbvia, por desmotivar a população a fazer parte. Sei que há serviços mais difíceis de passar para a juntas, pelo menos, numa fase inicial. Uma das formas de o fazer seria com uma avaliação dos procedimentos em si. Acredito que haja uma avaliação dos funcionários, mas isso é diferente de uma avaliação dos procedimentos. Quando há uma falha numa entrega, onde se falhou? A câmara pode ficar mais focada em aspetos mais abrangentes. É preciso também integrar essa melhoria de serviços nas juntas. Se queremos fazer a transferência de competências, a melhoria tem de estar logo integrada nessa transferência.
RC > A falta de médicos no concelho é uma das bandeiras da sua candidatura. Como pretende resolver essa questão?
SLA > Infelizmente ou felizmente a questão da saúde não está dependente dos municípios, mas podem e devem criar condições de cativar os profissionais de saúde a ficarem cá e a fazerem parte dos centros de saúde e das unidades de saúde locais. Isso passa pelas condições de vida, pela habitação e pelo aliciamento profissional dos médicos. Essa parte tem de ser trabalhada. Outra questão tem a ver com as infraestruturas. Consigo perceber que há um problema nas equipas médicas, mas também consigo perceber que se as equipas não tiverem instalações onde se sintam confortáveis, é-lhes mais difícil prestar serviços de saúde de qualidade à população. O que estamos a tentar desenvolver, com outras medidas para captar profissionais de saúde, é dar-lhe boas condições que os aliciem a ficar. Para isto funcionar não podemos estar só focados nos profissionais de saúde. Se queremos um concelho dinâmico precisamos de mais talento.
RC > E como pretende captar esse talento?
SLA > Havendo essa descentralização para as juntas, contamos que o concelho consiga ficar mais focado na captação de talento. Através da análise de sinergias que se conseguem fazer e aliciar os jovens alcobacenses que vão para fora a voltar. Há empresas de excelência, mas não são suficientes para captar a grande parte dos jovens. Queremos que os jovens tenham vontade de ficar cá. E os menos jovens também. Isso poderá passar pela criação de um gabinete integrado na câmara, que se foque nestas questões.
RC > E qual a estratégia que definiram para a habitação para alcançar esse objetivo?
SLA > A habitação é central. Daquilo que temos vindo a preparar, é um dos temas críticos. O município tem de ser capaz de promover a requalificação para que seja mais fácil requalificar do que deixar ao abandono e, em simultâneo, facilitar nova construção. Há serviços de arquitetura e outros dentro da estrutura da Câmara e capacidade interna para diminuir os custos da construção da habitação e é por aí que estamos a procurar desenvolver propostas concretas para esta área.
RC > A sua experiência nas legislativas ajudou-a a entender melhor a política local?
SLA > Fui candidata nas eleições legislativas de 2024 por Lisboa. Ao fazer parte destas listas, ao dar a cara, ficamos a perceber os problemas na vida política. Julgamos sempre que estão lá porque querem cargos e tachos, mas, na realidade, não é isso que se passa. É muito difícil conseguir pessoas que estejam dispostas a dar a cara e a falar nos assuntos, mesmo quando não têm grande conhecimento. Se queremos diversidade na política, precisamos mesmo de dar a cara. Espero que também seja uma mensagem de incentivo. Mesmo que não esteja associado a um partido, mas em termos cívicos.
RC > E porquê integrar as listas do Círculo Eleitoral de Lisboa e não de Leiria?
SLA > Foi uma curiosidade. Em 2024, a forma da Iniciativa Liberal fazer a seleção de candidatos foi diferente destas por uma questão de timming. E em 2024, foram propostos nomes pelos vários núcleos e em Lisboa houve a proposta do meu nome por causa da minha área profissional; era das poucas pessoas que tinha conhecimentos sobre recursos minerais e parecendo que não é uma área crítica para todas as outras. Acabei por ficar nos lugares não ilegíveis.
RC > O PSD domina o concelho há 28 anos. É possível inverter esta tendência?
SLA > Vai acontecer. Não digo que seja o PSD a deixar de ter a presidência. Seria interessante se isso acontecesse… mas, julgo que vai haver mudanças. E acredito que a IL pode ter um papel importante nessa mudança. As pessoas estão a começar a querer coisas diferentes, há ideologias diferentes. Se vai ser tão pronunciado como a nível nacional, não sei. Mas que essas mudanças que a população anseia estão a começar a vir ao de cima, estão.
RC > A IL, nas últimas eleições autárquicas, conseguiu 3,42% dos votos para a Câmara de Alcobaça. Eleger um vereador na próxima eleição seria uma vitória?
SLA > Seria. Um vereador e três deputados. É esse o nosso objetivo. Mostrar que estamos cá, que temos vontade e um olhar isento de um passado político. Procuramos proximidade com as pessoas. Queremos que todos façam parte, queremos ouvir todos. Para estarmos mais próximos, queremos começar a eleger deputados e vereadores e nas juntas que nos estamos a propor. Em São Martinho do Porto e na Benedita. Até era possível irmos a mais juntas, mas interessa mais fazer um bom trabalho agora e evoluir de forma sustentável.