Vasco Gomes escreveu, em dezembro de 2003, no REGIÃO DE CISTER um texto premonitório sobre a polémica requalificação da zona envolvente ao Mosteiro de Alcobaça. Passam hoje precisamente dez anos sobre a inauguração da obra de Gonçalo Byrne e Falcão de Campos.
O texto do que viria a tornar-se porta-voz da Comissão Representativa de Empresários, Proprietários e Moradores de Alcobaça (CREPMA) era duro e terminava assim: “Senhores autarcas, gostaria que tudo o que referi não passasse de um delírio da minha imaginação, e que daqui a 10 anos não se arrependam do que vão fazer, infelizmente nessa altura, será tarde, não poderemos fazer um balanço conjunto, pois os senhores já não ocupam os seus atuais cargos, abandonados com uma boa reforma, paga pelo erário público, e eu, a meio da minha vida ativa, infelizmente, já terei fechado as portas”.
Nem todas as previsões batem certo, mas dos três estabelecimentos comerciais que a Despensa tinha pela cidade apenas um se mantém aberto. 10 anos depois. O que mudou? Estão os comerciantes satisfeitos com as obras de requalificação? Terá a Crepma atingido os seus objetivos? O que ganhou a cidade com o projeto, durante um dos mandatos de Gonçalves Sapinho?
“Senhores autarcas, gostaria que tudo o que referi, não passasse de um delírio da minha imaginação, e que daqui a 10 anos não se arrependam do que vão fazer”, escreveu o empresário Vasco Gomes no REGIÃO DE CISTER, na edição de 31 de dezembro de 2003
Há precisamente 10 anos, Alcobaça acordava para a inauguração das obras de requalificação. Num dos estabelecimentos comerciais estava pendurada a faixa: “Contra tudo e contra todos, a Praça foi inaugurada”. Foi, sem dúvida, a obra mais emblemática e polémica da era Gonçalves Sapinho à frente da autarquia.
A requalificação nunca foi consensual. Enquanto a Câmara mantinha a decisão de avançar, a CREPMA preparava uma moção para travar as obras, na qual reuniu mais de 1.800 assinaturas.
Gonçalves Sapinho decidiu suspender o projeto de requalificação, depois de mais de duas centenas de pessoas se manifestarem pelas ruas da cidade até aos Paços do Concelho. A Crepma exigia mais lugares de estacionamento em frente ao Mosteiro, após a desistência da construção do parque subterrâneo, e a manutenção da circulação no centro histórico. O diálogo entre a Comissão e a Câmara durou pouco tempo. Enquanto a Crepma decidia impugnar o projeto de requalificação, a Assembleia Municipal aprovava a adjudicação da obra. O braço de ferro manteve-se.
O que conseguiu a Crepma? Segundo Vasco Gomes, por sugestão da Comissão, foi implementada a linha de carreiras, que auxilia a mobilidade urbana; alterou-se o estacionamento dos autocarros para junto ao Mercado Municipal, contrariando a ideia do Parque da Cova da Onça; desistiu-se dos plátanos em frente ao Mosteiro. Percebeu-se, avança o empresário, que o projeto era uma “manta de retalhos”, que “não se preservaram os achados arqueológicos na Rua D. Pedro V, nem na cerca do Mosteiro”. Além disso, acrescenta que o “custo real das obras nunca foi revelado, face às sucessivas derrapagens, e o projeto também nunca foi concluído, porque estava prevista uma intervenção na Rua Dr. Francisco Zagalo”.
Passados 10 anos, Vasco Gomes refere que, à exceção de três ou quatro meses, o Rossio está deserto. “A Despensa passou de 14 para 6 funcionários e as vendas reduziram em 50%”, testemunha o empresário, que mantém a opinião que o projeto não teve em conta as pessoas e que há um progressivo abandono da zona histórica, devido à inexistência de trabalho, não esquecendo a degradação das habitações.
A Crepma juntou pessoas de diferentes quadrantes políticos e profissões. “Perdeu-se a oportunidade de ter estas pessoas a pensar Alcobaça”, salienta Vasco Gomes.
Mas no entender do presidente da Câmara, a cidade “teve ganhos significativos na abertura que se deu à monumentalidade do Mosteiro, procurando o revivalismo histórico”. No entanto, Paulo Inácio reconhece, como aspetos negativos, a má qualidade do piso e a falta de estacionamento, face à desistência do parque subterrâneo na Praça, que dificulta a acessibilidade ao monumento. “Estamos atentos e a estudar qual a melhor solução ao saibro. Relativamente à Rua Dr. Francisco Zagalo, foi preferível manter o piso em alcatrão, por questões de segurança, do que substituir pela mesma pedra que está em frente aos CTT”, frisa o autarca.