A investigação da verdade, a vontade de ler o pensamento alheio, para o controlar deve ser tão antiga como a humanidade. Com o advento da ciência, esta também quis, e quer, dar uma palavra sobre o assunto. E nasceu, assim, o polígrafo: quando uma pessoa é questionada, uma série de cabos e sensores examinam os batimentos cardíacos, a pressão arterial, a frequência respiratória e a atividade eletrodérmica de uma pessoa… E, no fim, sai o veredito. Simples, não é? Parece que não e, felizmente, já quase ninguém o usa.
… a não ser a SIC que deu o mesmo nome a um programa – que procura estabelecer “os factos”.
E como são estabelecidos “os factos”?
Recorrendo ao contraditório.
E que “factos” são estabelecidos?
Aqueles que o autor do programa escolhe?
E não há outros “factos” que pudessem ser estabelecidos?
Claro que há…
E as perguntas poderiam continuar quase indefinidamente, mostrando o quanto estamos longe dos factos. Na verdade, entre nós e os factos há uma distância intransponível, sendo perigoso pugnar por uma versão que, não sendo mais do que isso, nos é imposta como “a” verdade.
Hegel, a respeito da filosofia, disse que ela chega sempre demasiado tarde e que, tal como a “Ave de Minerva”, levanta voo ao entardecer. Hoje, com demasiada facilidade, nos esquecemos disto, nos esquecemos de algumas lições que a humanidade já deveria ter incorporado em si, como algo genético. Já deveríamos saber que a verdade, a “essência da realidade” é uma realidade fugidia, que se mistura com coordenadas temporais e espaciais, com tonalidades afetivas. É por isso que os delitos de opinião não fazem sentido. Deveria haver uma margem imensa para a tolerância. Na verdade, nunca teremos direito a mais do que à “nossa verdade” – por mais polígrafos que nos queiram impingir.