Manuel Almeida anda na casa dos “setentas”, mas há 20 anos que faz da Praça da Nazaré o “escritório” de trabalho. Daquele local, parte diariamente para centenas de quilómetros, uma vez que as “ondas gigantes” da Nazaré não só foram boas para o setor do turismo, como também têm sido felizes para a dezena de taxistas que ali trabalha.
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“A onda gigante trouxe muita gente para a Nazaré e, naturalmente, mais serviços para os taxistas”, confidenciou ao REGIÃO DE CISTER, dando conta de que o turismo “tem sido fundamental para a vila e para o concelho”.
O alcobacense “pega ao serviço” às 7 horas da manhã, sendo que a hora de concluir o dia de trabalho nunca é certa. “Tudo depende. Durante o inverno é por volta das 20 horas, mas durante o verão pode esticar-se até às 23 horas”, conta o taxista, reiterando que durante a época balnear o negócio é “sempre mais rentável”.
Os clientes ora são portugueses, ora são estrangeiros, mas nem o idioma distinto é problema: “ninguém fica em terra”, brinca Manuel Almeida, recordando que, devido ao turismo, já há muitos estrangeiros no concelho. “E andam muito de táxi”, nota, acrescentando que “o pouco inglês” que domina é suficiente para o dia a dia. “Acaba também por ser uma forma de melhorar o meu inglês”, assume.
Sobre o facto de haver cada vez mais veículos de mobilidade urbana, o taxista afirma que “dá para todos”, elencando o Sítio como o local mais requisitado, mas também as viagens até Fátima ou Óbidos.
O turismo impulsionou o número de serviços efetuados diariamente por cada taxista, mas nem isso afetou a clientela mais antiga. “Continuamos a transportar as nossas gentes até aos hospitais das grandes capitais de distrito”, reiterou o taxista “a tempo inteiro”. Ou não fosse, por vezes, abdicar dos fins de semana em Lisboa com a família para continuar a transportar turistas e nazarenos. Até a entrevista teve de ser interrompida para transportar um casal de… estrangeiros.
Na fila, que é “religiosamente” seguida por cada taxista, segue-se Valdemiro da Conceição. Aos 78 anos, atirou de imediato já estar na reforma, mas como sempre gostou de trabalhar, decidiu, há 13 anos, e depois de uma carreira profissional na Marinha Mercante “aventurar-se” no ofício de taxista na Nazaré. “Foi um passatempo para não estar parado e para não me assentar no banco da pulga”, brinca o famalicense.
O antigo comandante de profissão, que diz conhecer a vila (e o concelho) de uma “ponta à outra”, partilha da opinião de Manuel Almeida e sublinha que o turismo veio impulsionar o setor. “Todo este movimento turístico, o crescimento da indústria hoteleira, a questão das ondas… tudo veio ajudar ao negócio”, evidenciou, contando que diariamente chega a “fazer mais de uma dezena de serviços”. Ainda assim, lamenta que “numa terra onde há tanto turismo, haja tanta escassez a nível de parqueamentos para táxis e autocarros”…
À semelhança do colega, Valdemiro da Conceição admite que o inglês não é um entrave. “Sou um poliglota”, atira, motivando uma gargalhada entre os “pares” que assistiam à entrevista do REGIÃO DE CISTER.
Apesar de gostar muito daquilo que faz, o septuagenário admite que está a ponderar “em breve fechar definitivamente a porta do táxi”, até porque “namora” há 57 anos e “entretanto” é tempo de parar. “Ela já me disse: ‘Valdemiro, já chega, para nós passarmos também um bocadinho juntos”, confessa, sempre sorridente, um dos taxistas que é um “rosto” bem conhecido na Praça de Táxis da Nazaré e que, por enquanto, é um dos profissionais responsáveis por tornar as deslocações de nazarenos, “palecos” e estrangeiros um pouco mais divertidas.
Até porque, a julgar pelo crescimento turístico da vila piscatória, o difícil será mesmo fechar a porta do táxi. A não ser que seja apenas um gesto de cortesia antes de se preparar para iniciar mais um serviço: “Faça favor de entrar. Qual é o destino?”. Ou, se for para um turista: “Let’s go. Where do you want to go?”
Em Alcobaça, os dias calmos são uma preocupação…
Se na Nazaré, há dias que são uma verdadeira azáfama e em que apenas existe a hora de “entrar ao serviço”, em Alcobaça, o cenário é bem mais calmo, uma vez que há cada vez menos serviços. “Este setor não tem futuro“, lamenta João Rebelo, de 75 anos, considerando que “em Alcobaça não tem explicação”.
“Há dias que nem um serviço fazemos e quando fazemos são serviços mínimos”, afirmou, explicando que a maioria dos serviços que faz são deslocações como idas ao supermercado ou à farmácia. “Não estamos a menosprezar esse tipo de serviços”, frisou, sublinhando apenas que são “insuficientes” para os 25 taxistas estabelecidos na cidade de Alcobaça.
Para esta problemática, o profissional do setor aponta como causas a “falta de disciplina e de regulação do setor”. “Andamos à deriva”, destacou, antes de ser interrompido por uma chamada para um serviço em que teve de ir a um… supermercado.
A opinião foi, de resto, corroborada por outros profissionais da Praça João de Deus Ramos, localizada junto à Câmara de Alcobaça, que não esconderam alguma desilusão com a evolução (ou falta dela) do setor.
“O número público da praça não é conhecido pela população em geral e há táxis de fora da freguesia, e do concelho, que estão a efetuar serviços nesta zona, o que complica ainda mais o nosso dia a dia e é concorrência desleal para nós que estamos aqui diariamente”, queixava-se um dos profissionais, justificando que há semanas em que, a título de exemplo, não faz um serviço até à Nazaré.
Além disso, desabafou, há um crescente número de empresas que oferecem o mesmo tipo de serviços, assim como instituições que já fazem o próprio transporte das pessoas. “Antigamente, tínhamos deslocações a hospitais, a centros de saúde, etc. Agora já nem isso”, apontou.
É caso para dizer que o setor já viveu dias mais prósperos na cidade. Agora, resta “agarrar” todos os serviços que forem aparecendo e esperar por dias melhores.