O Outono mostra-se, bem português.
Ainda há uns dias a floresta ardia, agora chove a cântaros, os miúdos já na escola, os pais e mães dentro dos carros impunemente mal-estacionados em frente ao Ciclo, à espera de uns filhos que são mais que os outros.
A silly season acaba, começa a dureza.
A primeira notícia mundial é de um rapper que organizava e filmava orgias na América, líder em tudo, especialmente no que é perverso.
Por cá, Bibi, o motorista da Casa Pia sai em condicional, porque não, estão todos cá fora, há sempre espaço para mais um.
Setembro acaba, entra outubro, com promessas de menos chuva que o ano passado; horizontes de novas eleições, já estou farto de ir ao centro escolar votar, António Zambujo em Alcobaça; o papo seco cada vez mais mole, caro e sem vida; e o conforto de limparmos as gotas que ainda caem do céu, com uma toalha do armário da casa de banho, e, para quem pode, ver as notícias regionais do fim de tarde, com um chá, com um vinho, com um aperitivo.
E há a ilusão do recomeço, na desilusão da curteza das férias, da volta da rotina café-trabalho-café-trabalho, das guerras que, em vez de pararem, intensificam; no inevitável pessimismo que a todos afeta, sem sabermos de onde vem e para onde vai a culpa e o cartório.
Mas, mesmo assim, se não prosperamos, perseveramos: em nome daqueles que amamos, os nossos filhos e filhas, sempre a pensar em como cumprir a jura de os proteger, e ensinar a contornar as miragens que nos seduzem em nome da grande ilusão que são estes nossos tristes tempos, lentíssimos adágios de uma época que todos os dias nos desafia e para a qual não temos resposta pronta.
Nem nas notícias do mundo, nem num jornal regional, nem nos bairros de nova porque, nem nos casais aos arredores de Alcobaça.
Nem na chuva que cai, ou na que fica por cair.