Três elementos dos Amigos da Letras, de Alcobaça, visitaram um grupo de reclusos da Prisão-Escola de Leiria para uma tarde de poesia atrás das grades, que o REGIÃO DE CISTER acompanhou.
O poder das palavras não pode ser medido. Muito menos quando elas se reúnem em forma de poesia e passam mensagens de esperança num futuro melhor. Foi com esse intuito que três elementos dos Amigos da Letras, de Alcobaça, visitaram um grupo de reclusos da Prisão-Escola de Leiria para uma tarde de poesia atrás das grades, que o REGIÃO DE CISTER acompanhou.
No ano passado a experiência já tinha sido marcante. “Foi por ocasião do Dia da Árvore. Plantámos árvores e trouxemos livros”, recorda Fernando Barroso, um dos rostos da associação de Alcobaça que teima em fazer acontecer coisas relacionadas com a cultura. Seja num anfiteatro ou num átrio de uma prisão-escola. “Todos temos o dever de ajudar estes jovens. Toca-nos quando encontramos esta realidade”, nota o professor, que conseguiu realizar a iniciativa com o apoio da colega Diana Fonseca, docente na Rodrigues Lobo, em Leiria, estabelecimento de ensino que tem um protocolo com a prisão-escola.
”Desenvolvemos atividades extracurriculares, reforçando o gosto pela leitura e poesia nesta comunidade. Sabemos que os livros não mudam o mundo, mas mudam as pessoas que mudam o mundo”, diz, com um sorriso, a professora, cujos olhos brilham ao falar de uma iniciativa que consiste num “trabalho completamente diferente do que é feito na escola, numa sala de aula dita normal”.
Natércia Inácio, uma mulher de armas que não se atemoriza com a presença na audiência de tantos “matulões”, não esconde a emoção e lança a pergunta. “Isto é uma prisão de jovens. Mas os nossos filhos são perfeitos?” Mas o maior lamento da alcobacense é o estado de abandono a que os reclusos são votados pelas famílias e amigos. É também por isso que faz questão de realizar este tipo de intervenção, que considera “social”. “Há muitos destes jovens que não têm visitas há anos. Nalguns casos, foram criados pelos avós, que, devido à lei natural da vida, acabam por ficar envelhecidos e, depois, não os conseguem vir visitar. Estes rapazes são “gente como nós”, que merece atenção. “Todos temos o dever de os ajudar”, nota.
Fernando Barroso, o docente de artes, que no ano passado apostou na ilustração para captar a atenção dos reclusos, desta feita, optou por uma abordagem distinta, alicerçada nas palavras. E nos livros. “Somos uma associação cultural e social, temos esta responsabilidade. Infelizmente, a sociedade, ou seja, as pessoas distanciam-se muito desta realidade. No ano passado plantámos uma árvore e oferecemos livros, este ano quisemos fazer diferente”, frisa.
E conseguiram os objetivos, tanto mais que até a música esteve presente. Coube a Luís Ramalho trazer a guitarra e a aparelhagem que amplificou os sons e deu cor à poesia soletrada por quem sabe da poda. O empresário nem hesitou quando foi desafiado pelos companheiros para avançar para a prisão-escola de Leiria. “Aceitei de pronto. É importante ajudar-mos o próximo. Faço este tipo de atividades noutro contexto, por isso esta visita tem ainda maior importância em termos humanos”, refere o beneditense, aguardando que aqueles jovens “possam agarrar outras oportunidades na vida” e encontrem o “seu caminho”.
Foi, como não poderia deixar de ser, um dia bastante diferente do habitual para muitos jovens reclusos de Leiria, que participaram ativamente na iniciativa, das mais diversas formas: lendo poemas, cantando ou simplesmente ouvindo as palavras e a música. A poesia tem o condão de aproximar as pessoas, de unir, de provocar sentimentos. E quando se conquista o silêncio num átrio de uma prisão-escola, onde confluem dezenas de jovens que sofreram já muitas agruras da vida, pode dizer-se que o objetivo desta iniciativa foi plenamente atingido. Nem seria preciso esperar pelo abraço sentido que Natércia recebeu (e devolveu) de um jovem que, como ela bem salientou, podia ser seu filho.