O único vereador eleito pela CDU na história da Câmara de Alcobaça regressa à primeira linha do combate autárquico no concelho. O histórico dirigente do PCP aponta prioridades para a habitação e saúde e defende uma política mais participativa e próxima da população.
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REGIÃO DE CISTER (RC) > Já depois de se ter “despedido” como vereador em 2017, afirmou que a CDU precisava de renovação. Mas volta, agora, a candidatar-se à Câmara. Que razões explicam esta decisão?
ROGÉRIO RAIMUNDO (RR) > É simples. As equipas formam-se na CDU e quando chega a decisão sobre quem é o primeiro da lista à Câmara, à Assembleia de Freguesia ou Municipal temos de ter em conta os que estão – e temos muitos novos, mas os novos, embora capazes de fazer esta campanha, admitem que não têm a experiência nem o conhecimento do concelho que eu tenho. Apesar de ter saído como vereador em 2017, há ainda muita coisa que não foi feita e que estava planeada no concelho, pelo que aceitei voltar a candidatar-me.
RC > Concorda com a perceção de que a figura do Rogério Raimundo é a CDU/Alcobaça? Foi o único vereador eleito até à data…
RR > Depois de ter saído, houve a experiência com a Vanda Marques e com a Clementina Henriques. Mas considerou-se que eu estava em melhores condições para encabeçar a lista, e cá estou eu, para tentar respeitar a decisão maioritária – e minha – porque, de facto, gosto disto, gosto da política, gosto de servir. Na minha aldeia, procurei durante toda a minha vida encontrar soluções para todos. No Centro Cénico da Cela dediquei mais de 50 anos de trabalho voluntário. Fazer e ver coisas a correrem bem e as pessoas felizes é uma das minhas maiores felicidades. Gosto de colaborar e intervir no coletivo, em conjunto com as outras forças políticas, e potenciar as melhores soluções para o concelho de Alcobaça.
RC > Ainda que haja boas intenções, não teme um certo cansaço do eleitorado perante a escolha de Rogério Raimundo?
RR > É natural. O 25 de Abril já se fez há 50 anos. Há muito eleitorado que votava CDU – chegámos a ter 6.500 votos –, mas infelizmente já morreu muita gente. Também deixei de ser professor, tenho menos gente conhecida no eleitorado. Alguns podem não achar bem que concorra. Há esta coisa contra os idosos: “O que é que ele vai para lá fazer com esta idade?”. Mas o meu lugar está à disposição de qualquer camarada.
RC > Apesar de a CDU ter tido representação no executivo durante duas décadas, tem vindo a perder terreno nas últimas eleições. Quais são as lições tiradas dessa experiência e de que forma pensa inverter essa tendência?
RR > Cada processo tem a sua história. Como qualquer processo de vida, de empresa, de grupo, há um processo normal de crescimento e de quebras. Ou não conseguimos convencer o eleitorado ou não conseguimos fazer a campanha que fizemos no passado. Não enviámos o jornal para casa das pessoas, não tivemos a Bandinha da Alegria a entrar nos mercados e a andar no último dia de campanha na cidade de Alcobaça. Fizemos campanhas muito mais fracas em 2017 e em 2021 do que quando conseguimos eleger vereador. Se a mensagem chega a menos pessoas… o resultado reflete-se. Ultimamente também há o fenómeno de haver mais partidos. Concorri em campanhas só com PSD, PS e CDS. Hoje temos uma carrada de partidos e isso também faz desviar alguns eleitores, que eventualmente, no passado, votaram em mim. Agora há mais escolha e temos de aceitar o que o eleitorado escolhe.
RC > A CDU nunca concorreu em todas as freguesias no concelho de Alcobaça. É desta?
RR > Não sei se concorremos a todas num determinado ano… Há quatro anos não concorremos em Turquel, no Vimeiro e em São Martinho do Porto. Concorremos a 10 freguesias e esse é o objetivo deste ano. Temos elementos novos, mas não temos condições para fazer listas com elementos de todas as freguesias de Alcobaça.
RC > Quais são as principais mudanças que o eleitorado pode esperar da CDU?
RR > Vamos insistir muito na participação e no envolvimento das pessoas. E agir, conforme esses debates. Na minha aldeia da Cela finalmente vai começar a obra do restauro do depósito de água, que há 10 anos precisava de ser reparado. Mas, ninguém sabe o que vai ser feito. Provavelmente será pintado… O maior investimento é o restauro do Centro de Saúde da Cela. Depois de muitas peripécias, chega-se à conclusão que a Junta da Cela e a Câmara optaram por restaurar em vez de fazer um novo, que era o que estava planeado em 2017, no tempo em que se fez a municipalização e a passagem dos equipamentos da saúde para a responsabilidade das Câmaras. Falava-se de três novos centros de saúde: Cela, Aljubarrota e Évora, mas pela informação que recebemos através da comunicação social, só haverá um novo e em Évora. Os presidentes de Junta entendem que não é preciso um novo, aceitaram o recuo. Mas o Ministério da Saúde devia financiar um novo para estas três freguesias.
RC > Quais são os principais projetos que considera prioritários para o desenvolvimento de Alcobaça nos próximos anos? E como vai garantir que sejam bem executados?
RR > A prioridade local, como a nível nacional, é a habitação. O presidente Hermínio Rodrigues falou muito bem há quatro anos, quando disse que ia fazer habitação para jovens na Quinta da Conceição, em Alcobaça. Mas, a CDU sempre esteve contra ser só em Alcobaça e só para jovens. Segundo o estudo que a Câmara pagou, havia 1.000 famílias vulneráveis que precisavam de apoio. Agora, na última assembleia municipal, o presidente referiu que foram apoiadas 350. Faltam 650 famílias. Numa Câmara que tem um pelouro da Felicidade não pode acontecer haver 650 famílias infelizes. Há aqui algo que não está bem. O problema da habitação tem de ser resolvido. E nem os jovens, nestes quatro anos, tiveram solução em Alcobaça. Temos de dar prioridade a isso e cortar noutras coisas talvez desnecessárias. Por exemplo: gastar energia de forma estúpida. Na ALEB, está tudo iluminado durante a noite, com uma iluminação brutal. Não se percebe como a Junta ou a Câmara não consideram isso um desperdício. Está tudo iluminado para se verem bem os ratos e a biodiversidade da ALEB? Anda tudo a dormir. Há que poupar. É um exemplo do muito que se pode fazer para canalizar recursos para a questão da habitação.
RC > O que a CDU pretende fazer para atrair os jovens para Alcobaça e dar-lhes mais oportunidades de estudo e de emprego?
RR > A CDU defende muitos concursos de ideias para pôr os especialistas a pensar. Esses talentos que se vão revelando também devem ser valorizados. Todos os anos devíamos ter uma gala dos talentos, das empresas, das instituições, como há no desporto.
RC > A CDU tem sido uma das vozes mais ativas na defesa da saúde pública. Que estratégias têm pensadas para essa pasta?
RR > Temos de continuar a pressão para combater o fecho das urgências de obstetrícia. O nosso concelho está entre Caldas da Rainha e Leiria, mas a resposta não é suficiente. Não há unidade de cuidados continuados no concelho. Temos de ir para Pedreiras, Leiria ou Pombal… Nos cuidados paliativos, apesar das 11 camas no Hospital de Alcobaça, também é preciso ampliar a resposta porque o nosso concelho é grande. E Nazaré e Porto de Mós estão aqui ao lado e este trio precisa de ter uma dinâmica maior de resposta.
RC > Olhando para uma esquerda que cai abruptamente nas últimas legislativas considera que esses resultados poderão influenciar as eleições autárquicas?
RR > Tenho uma experiência própria de que legislativas são legislativas e autárquicas são autárquicas. Em 1998 tomei posse como vereador na Câmara de Alcobaça com 6 mil votos. Em 1999, o coletivo do distrito achou que devia ser o cabeça de lista do distrito à Assembleia da República. A campanha fez-se, passado um ano e meio de estar na Câmara. Diziam-me: “Em Alcobaça, voto em ti, lá para cima, não, tenho medo dos comunistas”. A nível do distrito, subimos 20%, passámos de 10 mil para 12 mil em 1999. As pessoas diziam que não tinha hipótese nenhuma por misturar legislativas e autárquicas. Mas, em 2001, acabámos por ter mais 500 votos nas autárquicas. É um facto que tem influência, mas vamos ver. Pode haver surpresas. Vamos tentar a melhor votação possível.
RC > Em Alcobaça, perante um PS frágil, com demissões e desistência do primeiro candidato, acredita que a CDU pode aproveitar esse cenário para conquistar mais votos à esquerda?
RR > São os eleitores que vão decidir. Uns vão dizer que estou muito velho e vão votar num rapaz novo. E outros dizem que ele é novo e não tem experiência. Conheço o candidato do PS como aluno, entrevistou-me para um trabalho de História. Tem sido ativo na juventude, concorreu para a Comissão Concelhia de Alcobaça do PS. Ele é combativo. Não sabemos como vai ser a campanha. Há franjas que até não iam votar e agora vão votar, como foi o caso surpreendente das últimas eleições, que beneficiaram o partido mais à direita. Foi buscar muita gente que nunca votou, mas que acha aquele discurso porreiro. Entusiasma-se e vai votar. Tenho vizinhos que me dizem isso, fico em estado de choque, mas a ver se os convenço a votar em mim nas próximas autárquicas…
RC > Como avalia o primeiro mandato de Hermínio Rodrigues à frente da Câmara?
RR > Apesar de ser o primeiro mandato como presidente, ele esteve comigo os 18 anos que fui vereador. É difícil encontrar mais alguém que o conheça tão bem a nível pessoal e político. O Hermínio Rodrigues teve a capacidade de resolver uma série de problemas que passaram por mim, ao longo de vários anos. O maior foi a Cister Equipamentos SA. Estive lá, alertei que se ia perder dinheiro. Os centros escolares e o pavilhão de Évora podiam ter sido financiados por dinheiros europeus a 80% e não foram, foi uma pipa de massa que Alcobaça não recebeu porque se optou por uma parceria pública-privada. A outra questão que resolveu, a CDU votou a favor, o problema das ruínas da Raimundo & Maia. A primeira vez que tivemos conhecimento disso foi em 1998. Houve as primeiras negociações e não se chegou a acordo. As propostas que a Câmara fazia, a empresa não reagia positivamente. Defendi a expropriação, é da lei, é interesse público não ficarem ali as ruínas, é vantajosa a ligação entre o rio e o Mosteiro. Até que José Sapinho em 2009 resolve fazer a expropriação. E pediu uma proposta ao arquiteto Gonçalo Byrne e fez-se a avaliação do terreno em 800 mil euros. Paulo Inácio pôs isso numa gaveta e passados 12 anos voltou a falar em expropriação. O Hermínio chega e resolve. Custou muito? Custou. Foi uma vergonha as fotografias que correram mundo inteiro. Mas, não resolveu o problema da habitação. As festas são mais que muitas, as pessoas gostam. Não é isso que criticamos. Tem é de haver boa gestão. A CDU não concorre contra, somos favor do diálogo e de uma solução conjunta.
RC > O que será um bom resultado para a CDU nas eleições do próximo dia 12 de outubro?
RR > Ganhar a Câmara, ser o presidente da Câmara de Alcobaça ao fim destes anos todos era uma alegria e dava-me mais 10 anos de vida.