Aos 96 anos, Adventino Ferreira continua com a força de outrora, que lhe permitiu sobreviver durante quase três anos como preso político do Estado Novo. Foi nesse tom que falou aos alunos da EB 2,3 de Pataias, na passada quinta-feira, no âmbito dos Dias+, sob o tema do 25 de Abril e da liberdade. O resistente comunista foi um dos oradores convidados pela Universidade Sénior de Pataias (USP), que promoveu várias atividades, após desafio da escola.
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“Se não fosse forte de cabeça, não tinha aguentado”, garantiu o nonagenário, enquanto descreveu as torturas a que foi sujeito, como a “Estátua”, que o obrigava a estar imóvel durante horas fio.
O antigo empregado de uma empresa produtora de vidro era comunista e foi denunciado por um camarada, que terá garantido à PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado) que Adventino Ferreira sabia quem eram todos os comunistas de Pataias. Não tardou até que a casa onde morava com os pais, na então aldeia, fosse cercada pela polícia do regime. Foi detido, julgado, no Tribunal da Boa Hora, que decretou uma pena de prisão de quase três anos. A sentença não o mencionava, mas esperavam-no também episódios diários de tortura, primeiro no Aljube e depois em Caxias. Emocionou-se várias vezes no decorrer da sua intervenção, ao lembrar os horrores a que foi submetido. “Nunca falei”, orgulha-se o comunista, que, claro, sabia o nome dos cerca de 40 filiados do Partido Comunista Português em Pataias, mas sempre protegeu os camaradas.
Ao antigo resistente, que mantém a rotina diária de trabalhar as terras quer chova ou faça sol, juntaram-se a pataiense Maria Bagagem, que descreveu como era ser aluno durante o Estado Novo, e a montense Maria de Lurdes Sousa, que começou a dar aulas no ano da revolução.
O coro da USP tinha atuado na véspera, com “E depois do adeus”, de Paulo de Carvalho, “Grândola”, de José Afonso, e “Somos Livres”, de Ermelinda Duarte, esta última música em conjunto com os alunos da EB 2,3.
A USP operou ainda um verdadeiro regresso ao passado, ao decorar uma pequena sala – “A sala dos nossos avós” – com a mobília de outrora: as carteiras, a caixa métrica, os mapas, os rios, as estações de caminhos de ferro e diversa memorabilia e onde não podia faltar o crucifixo e o retrato de Salazar.
No exterior da escola, os alunos foram estrategicamente colocados para formarem o número 50, com gigantes cravos vermelhos. As simbólicas flores, construídas pelos jovens, foram depois colocadas junto à entrada principal da escola, onde, numa faixa, se pode ler: “Liberdade 50 anos, 50 cravos”.