Será que ainda sabemos ninhos? Será que esquecemos, colectivamente, o prazer de partilhar pequenas descobertas e de as respeitar e de esperar que se revelem sem nos precipitarmos na sua devassa? Será que as redes sociais já só sabem expor, maldizer, falsear e que, nelas, esquecemos os nossos valores? Será que não se sabem ninhos nesta floresta onde os ovos podem ser tudo, desde balas de borracha a pedras de vidro? Será que ainda sabemos preservar os frágeis ovinhos e a esperança que guardam lá dentro?
Confesso que, há não muito tempo, quando surgiram as primeiras redes sociais, aderi com entusiasmo a este mundo virtual de inimagináveis possibilidades. Sou uma profissional da comunicação e um novo e promissor canal, só podia significar mais oportunidades, mais media para mais vozes partilharem e refletirem no espaço público. A informação seria mais célere, mais imediata, ofereceria mais ângulos e visões múltiplas…
O entusiasmo foi-se esmorecendo à medida que fui, sucessivamente, constatando que uma grande parte dos que habitam as redes sociais apenas se querem ouvir a si próprios, ver a si próprios e, nos intervalos, desferir algum juízo fácil sobre os outros. A informação e a opinião confundem-se com mentira e com a sentença falseada, o real e o inventado, fundem-se com a perfídia e com a vaidade.
Com o tempo fui percebendo que, naqueles espaços, tão democráticos e tão acessíveis a toda a gente, tudo o que é importante corre o risco de ficar submerso num mar de irrelevâncias, como se as redes tivessem vindo para concretizar a profecia do “admirável mundo novo” do Aldous Huxley.
Durante anos procurei argumentar contra o autoritarismo, a tentação do pensamento dominante e único, do politicamente correcto e do conservadorismo confuciano que nos impede de ousar a diferença. O totalitarismo era, no meu entender, o maior inimigo da liberdade. Hoje, confronto-me todos os dias com um perigo maior, que, à falta de melhor termo, só posso chamar de facilitismo.
Há, no espaço público, um campo que corre o risco de ser o da liberdade, para se transformar num matagal devassado onde não há respeito, nem palavras sagradas. E é pena, porque as redes são florestas e nas florestas temos de saber reconhecer e preservar os ninhos e a esperança. No entanto, como o Torga, eu
“Sei um ninho
E o ninho tem um ovo.
E o ovo, redondinho,
Tem lá dentro um passarinho
Novo.”