Muitas das grandes cidades do mundo foram construídas à “beira-rio”: Nova Iorque-Hudson; Moscovo-Moscou; Paris- Sena; Londres-Tamisa. Em Portugal, Lisboa-Tejo e Porto-Douro. Não é necessário um curso superior de engenharia para certificar estas escolhas: os rios permitiam a livre circulação de pessoas, bens e serviços e, em alturas menos cosmopolitas, a subsistência através da pesca e da agricultura. Peguemos então num Google Earth imaginário e façamos zoom sobre Alcobaça, que (até) deve o nome à junção entre os rios que a “banham”.
O divórcio entre Alcobaça e os rios é por demais evidente. Aliás, a cidade quase que os esconde entre minúsculas pontes pintadas de polémica local e um leito que dá dó, e que, em certas partes, não chega, literalmente falando, aos calcanhares de uma poça grande. A nascente há esperança, profundidade e até navegabilidade, mas depois é que são elas, ao percorrer um caminho que, com certeza, já os decisores políticos se esqueceram, tão arredondados que foram pelas rotundas, tão enfartados se encontram pelos empreendimentos. Decerto que há um projeto que nos ligará, não sabemos quando, nem quanto, à Nazaré, mas, não será outra vez o rio, uma mera testemunha e não uma personagem central, simples água corrente para ciclista ver a seco, quando, com boa vontade e inteligência, poderíamos mergulhar as ideias mesmo à saída da cidade?
Ao contrário dos nossos monges fundadores, que, reza a história, até pescavam dentro do mosteiro, Alcobaça só se lembra do rio quando cheira mal. Os peixes há muito que vão morrendo, enquanto o porco ganha o estatuto de atração de maravilha gastronómica, fazendo as delícias de quem o come e de quem transforma, empresas muito multadas, mas nunca saneadas e que fazem o rio feder a arrotos e a peidos.
Na terra da estabilidade, é pena que o Alcoa e o Baça sejam tão, mas tão estáveis, que quase nem sequer correm, nem mudam. Entre a serra e a praia, onde fica o rio? Aposto que muita gente que cá vive ou não sabe, ou já se esqueceu de procurar por ele.